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A polêmica da nova adaptação de O Morro dos Ventos Uivantes

O problema recorrente do casting de Catherine e Heathcliff

09/12/2024

Verdade seja dita: até hoje a maioria das adaptações de O Morro dos Ventos Uivantes, clássico inequívoco de Emily Brontë, teve dificuldades em encontrar os intérpretes ideais para seus protagonistas. E a nova versão que Hollywood está preparando, sob direção de Emerald Fennell, não será exceção à regra.

LEIA TAMBÉM: 5 Grandes influências de O Morro dos Ventos Uivantes na Literatura

Os trabalhos anteriores de Emerald Fennell incluem o vencedor do Oscar® Bela Vingança e o impactante, porém controverso, Saltburn. Seu novo projeto, no entanto, já está rendendo discussões antes mesmo de ser produzido. O motivo? A escolha dos atores para Catherine e Heathcliff.

Para contexto, caso você ainda não tenha lido O Morro dos Ventos Uivantes: o livro de 1847 conta a jornada de amadurecimento de Heathcliff, um órfão acolhido ainda criança pela família Earnshaw, que se apaixona pela pequena Catherine. O afeto, embora correspondido, transforma-se num amor impossível. Tal vínculo devastador é envolto por uma atmosfera sombria e um teor dramático e audaz que consolidaram Emily Brontë como uma das rainhas da literatura inglesa e influencia livros e filmes até hoje, incluindo o amor bandido da saga Crepúsculo.

o morro dos ventos uivantes

Para o filme de Fennell, Jacob Elordi e Margot Robbie foram anunciados para os papéis de Heathcliff e Catherine — que na maior parte da história original são dois adolescentes que vivem no interior rural da Inglaterra do século XIX. Quando paramos para pensar que estamos falando de dois australianos bronzeados com 27 e 34 anos, respectivamente, já temos alguma dificuldade de conectar uma coisa à outra — mas ok, atuação e caracterização fazem parte do trabalho.

Como foram as outras adaptações de O Morro dos Ventos Uivantes?

O filme de 1939 rendeu a Lawrence Olivier a indicação ao Oscar® por sua interpretação de Heathcliff — ainda que todo o seu cavalheirismo britânico da Royal Shakespeare Company não tenham favorecido muito a “natureza selvagem” de Heathcliff.

Para contextualizar melhor o personagem: Heathcliff é descrito pela primeira vez como um menino órfão, provavelmente pego nas docas de Liverpool, discriminado por se parecer com “um cigano de pele escura”, em alguns momentos sendo associado a ser possivelmente um imigrante do Sudeste Asiático, da América ou da Espanha — sua origem nunca é especificada. Entre seus crimes eventuais, diz-se que ele torturava filhotes de animais e batia em crianças. Mas o filme de 1939 transformou o livro em um romance típico hollywoodiano.

o morro dos ventos uivantes 1939

Ok, o ano era 1939, mas as adaptações mais recentes também preferiram seguir a linha mais romântica da história, deixando de lado seus elementos mais brutais. Além disso, a escalação de atores para Heathcliff continuou sendo predominantemente de atores brancos, como Timothy Dalton em 1970 e Ralph Fiennes em 1992

Aliás, vale lembrar que no filme de 1992 tivemos uma Catherine Earnshaw interpretada por Juliette Binoche, que manteve um sotaque francês bem forte para uma personagem do interior britânico. 

Melhor não entrar em detalhes, mas em 1996 ainda teve o musical de Cliff Richard que, com 56 anos, foi criticado por interpretar um Heathcliff adolescente como um ídolo pop. É, teve isso.

o morro dos ventos uivantes

Talvez a única diretora que conseguiu capturar um pouco da atmosfera digna de pesadelos da obra de Emily Brontë foi Andrea Arnold, que em 2011 escalou atores inexperientes para os papéis principais, incluindo um ator negro, James Howson, como Heathcliff. Uma escolha que ainda recebeu alguma controvérsia por parte de alguns críticos, mas que mudou o jogo.

Em pleno 2024 ainda precisamos lidar com isso?

Podemos até relevar que nas escalações mais antigas de Heathcliff os tempos eram outros. Mas em 2024 o público já está mais ciente de que escolher um ator como Jacob Elordi no papel de Heathcliff não apenas direciona o novo filme para o seu aspecto mais romântico — até porque podemos esperar qualquer coisa dele depois de Euphoria —, mas ignora todo o subtexto do imperialismo contido no livro de Brontë.

Há evidências que sugerem que a história de Heathcliff é pelo menos parcialmente inspirada por uma família real escravagista, os Sills, que, além de lucrarem com as plantações de açúcar na Jamaica, mantinha trinta africanos escravizados trabalhando em sua propriedade em Yorkshire.

jacob elordi

Os próprios personagens especulam sobre as origens de Heathcliff ao longo do livro. Por exemplo, Nelly Dean, a governanta dos Earnshaw, se questiona se o pai de Heathcliff teria sido um imperador chinês e sua mãe uma rainha indiana. Ou seja, ele obviamente não era branco.

Podemos esperar algumas surpresas de Emerald Fennell

Por mais que o filme já esteja nascendo envolto pelas críticas ao elenco principal, Emerald Fennell se mostrou uma cineasta que não tem medo de denunciar problemas sociais como a cultura do estupro em Bela Vingança ou o os privilégios elitistas dos mais ricos em Saltburn. E ela costuma fazer isso de uma maneira bem gráfica e desconfortável de assistir, então seria precipitado afirmar que sua versão de O Morro dos Ventos Uivantes focará apenas no lado romântico.

A obra de Emily Brontë é particularmente difícil de adaptar porque mostra o lado mais primitivo do ser humano, além de ser contada de uma maneira estranha. A autora nunca nos apresenta diretamente aos seus protagonistas. Nós só sabemos deles por meio de Lockwood, que por sua vez ouve a maior parte da história da governanta, uma narradora não confiável por ter o seu próprio viés diante dos eventos.

Há cenas importantes em O Morro dos Ventos Uivantes com uma carga dramática poderosa, típicas de melodramas góticos, como o fantasma de Catherine literalmente sangrando enquanto agarra Lockwood por uma janela e Heathcliff escavando o túmulo de Catherine para abraçá-la novamente.

saltburn

E Emerald Fennell parece ser a cineasta certa para não evitar retratar essas cenas em que o drama encontra o constrangimento — e se você assistiu a Saltburn sabe que ela não tem medo de profanar túmulos. Enquanto nada disso justifique o whitewashing que o filme já se propôs a ter em pleno século XXI, talvez possamos ter algumas belas surpresas nessa nova versão cinematográfica. 

Podemos não ter o Heathcliff e a Catherine que Emily Brontë pretendia em sua obra, mas talvez desta vez a história evoque a paixão, o sofrimento e a intensidade constrangedora deste amor bandido. Aguardamos os próximos capítulos.

LEIA TAMBÉM: 10 Adaptações de O Morro dos Ventos Uivantes para o cinema

Sobre DarkSide

Avatar photoEles bem que tentaram nos vender um mundo perfeito. Não é nossa culpa se enxergamos as marcas de sangue embaixo do tapete. Na verdade, essa é a nossa maldição. Somos íntimos das sombras. Sentimos o frio que habita os corações humanos. Conhecemos o medo de perto, por vezes, até rimos dele. Dentro de nós, é sempre meia-noite. É inútil resistir. Faça um pacto com quem reconhece a beleza d’ O terror. O terror. Você é um dos nossos.

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2 Comentários

  • Rosângela Maria Gonçalves Val

    16 de dezembro de 2024 às 21:11

    Acho muito válida a Darkiside colocar matérias como esta. Eu como leitora e fã da literatura inglesa tenho em Emily Bronte o meu jardim secreto. Fica muito difícil aceitar versões que deturpam a obra original suprimindo sua essência e toda a violência das emoções levando o espectador a ver uma obra como essa banalizada. Sinceramente???? ” Emily Bronte não é para qualquer um.

  • Patrícia

    17 de dezembro de 2024 às 20:09

    Excelente análise, mas eu tenho uma queda pela versão com Ralph Fiennes! Foi a primeira vez que tive contato com essa história, ele estava lindo no filme e depois li o livro… Mas agora são outros tempos, né. Tudo tem que ser tão menos romântico e mais sobre questões da sociedade.

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