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Caveira Viu: Frankenstein

A releitura do clássico, por Guillermo del Toro

12/11/2025

Desde que foi publicado pela primeira vez em 1818 pela jovem Mary Shelley, Frankenstein tem sido a prova viva de que uma mesma história pode ser contada inúmeras vezes de diferentes formas. Atravessando o tempo e o espaço com seus questionamentos sobre humanidade, vida e responsabilidade, a obra de Shelley mostrou uma versatilidade rara, conquistando um espaço cativo na cultura pop. 

LEIA TAMBÉM: Segredos dos bastidores de Frankenstein de Guillermo del Toro

Em mais de duzentos anos, Frankenstein foi levado incontáveis vezes para os palcos dos teatros e para as telonas dos cinemas, gerando uma quantidade praticamente infinita de adaptações, reimaginações e outras histórias. Desde a clássica interpretação de Boris Karloff na versão de 1931 produzida pela Universal, o cinema abraçou a história do cientista ambicioso que cria vida a partir da morte, não conseguindo lidar então com as consequências de seus atos. A Criatura de Shelley adentrou assim o imaginário coletivo e transformou-se em um personagem reconhecido tanto por sua monstruosidade aterrorizante quanto por sua tragicidade. 

É justamente a profundidade e a complexidade do texto original que fizeram com que em 2025 Frankenstein ganhasse mais uma versão, desta vez pelas mãos do visionário cineasta Guillermo del Toro. Protagonizado por Oscar Isaac, Jacob Elordi e Mia Goth, Frankenstein chegou ao catálogo da Netflix no dia 7 de novembro e a Caveira já foi correndo conferir essa aguardada adaptação de uma das maiores obras-primas da literatura de terror. 

Frankenstein

A saga gótica e trágica de Guillermo del Toro

Dirigida e escrita pelo próprio del Toro, esta versão de Frankenstein se destaca justamente por seu formato, o qual é dividido em duas partes. A primeira metade do filme apresenta a história de Victor Frankenstein (Christian Convery), uma criança talentosa que perde a adorada mãe, Claire (Mia Goth), durante o parto do irmão mais novo, ficando presa ao lado do pai, o detestável Leopold (Charles Dance), um renomado e exigente cirurgião. Motivado pelo desejo de superar a morte e ultrapassar a fama do pai, em 1855, Victor (Oscar Isaac) se torna um cientista brilhante, mas extremamente egocêntrico, vaidoso e inconsequente. Seu desejo de derrotar a finitude a qualquer custo é enfim incentivado por Heinrich Harland (Christoph Waltz), um comerciante de armas que aceita financiar seus experimentos científicos. A partir disso, entram em cena também o irmão mais novo de Victor, William (Felix Kammerer) e sua noiva, Lady Elizabeth Harlander (Mia Goth), a sobrinha de seu novo benfeitor. 

Enquanto Mary Shelley escreveu Frankenstein guiada por descobertas e experimentos recentes do início do século XIX no campo da eletricidade, química e filosofia natural, Guillermo del Toro opta por explorar outras temáticas, enveredando principalmente pela paternidade e dos ciclos viciosos de indiferença entre pais e filhos. No entanto, enquanto isso injeta contornos ainda mais trágicos e emocionais para a história, também suaviza nuances importantes dos personagens e suas trajetórias, deixando de lado o importante questionamento sobre o Bem e o Mal enquanto duas esferas que, no fundo, não são tão opostas assim.  

Por mais que a história de Victor seja importante para entendermos o desenrolar dessa tragédia, principalmente sua motivação e traumas, ela acaba construindo um personagem que desde o início é extremamente vilanesco, covarde e cruel. Ou seja, Victor nunca é retratado a partir de seus dilemas, falhas e inerente humanidade. Talvez, o grande problema é que del Toro – conhecido por seu profundo amor por monstros – em sua ânsia por construir uma Criatura empática, cria um Victor que é desde o início seu grande oposto, perdendo assim as nuances centrais que constroem os dois personagens e impulsionam a obra de Mary Shelley. Ou seja, enquanto Victor é construído como detestável como um todo, a Criatura é poupada de seus erros e atos mais lamentáveis, as quais são essenciais para aprofundarmos nas temáticas de humanidade, maldade e inocência corrompida. 

Contudo, esta mesma empatia que del Toro demonstra pela Criatura, a qual tem a chance de contar o seu lado na segunda parte do filme, é também aquilo que dá fôlego à Frankenstein, oferecendo um retrato profundamente carinhoso deste personagem tão icônico. O filme também se beneficia da performance tocante de Jacob Elordi, que fornece contornos diferentes à Criatura, transmitindo suas emoções pelos olhos e transformando-se no coração vivo desta adaptação. É fácil sentir compaixão pela Criatura de Elordi e del Toro, algo que funciona como uma faca de dois gumes, construindo um personagem comovente, mas despido de qualquer monstruosidade, dilema e dualidade. 

Além da brilhante performance de Elordi, outro destaque vai para Mia Goth, que novamente assume um papel duplo, interpretando tanto Claire Frankenstein quanto Elizabeth Harlander. É nessa última que a atriz encontra seu grande destaque, se beneficiando das mudanças que del Toro faz em relação ao texto original. Enquanto a Elizabeth de Mary Shelley ocupa um lugar mais secundário e passivo na trama como a noiva de Victor, aqui a Elizabeth de Goth rejeita qualquer ideia romântica, assumindo um papel mais ativo e questionador dos eventos e indivíduos que a cercam. Embora possa incomodar alguns fãs mais fieis à obra original, a recém-criada interação entre a Criatura e Elizabeth rende momentos genuínos de ternura e curiosidade, estabelecendo o tom para a segunda parte do filme. 

Mia goth Frankenstein

Entre altos e baixos, Frankenstein assume seu lugar como uma boa adaptação do romance de Mary Shelley. Com um design de produção deslumbrante e figurinos estonteantes, o filme consolida-se com um eficiente drama gótico, com del Toro optando pelas lágrimas no lugar dos sustos. Sem desperdiçar o visual de tirar o fôlego, o longa ainda se destaca por suas escolhas imagéticas, as quais reforçam os temas propostos no enredo. Vale prestar atenção, por exemplo, no uso recorrente da cor vermelha, na imagem da Medusa, na contínua utilização de objetos redondos e nas referências a filmes como A Noiva de Frankenstein (1935). Tudo isso contribui para uma experiência visualmente rica, que não apenas emociona como também arrebata, posicionando a adaptação como mais um trabalho formidável de Guillermo del Toro e sua equipe.  Apesar de alguns deslizes e alterações desnecessárias, Frankenstein não apenas firma o lugar de del Toro como um cineasta dos monstros, mas também dá o protagonismo merecido para a Criatura, gritando a plenos pulmões que ela está mais viva do que nunca.

Frankenstein

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Sobre DarkSide

Avatar photoEles bem que tentaram nos vender um mundo perfeito. Não é nossa culpa se enxergamos as marcas de sangue embaixo do tapete. Na verdade, essa é a nossa maldição. Somos íntimos das sombras. Sentimos o frio que habita os corações humanos. Conhecemos o medo de perto, por vezes, até rimos dele. Dentro de nós, é sempre meia-noite. É inútil resistir. Faça um pacto com quem reconhece a beleza d’ O terror. O terror. Você é um dos nossos.

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