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Cesar Bravo: “Eu precisei descansar do inferno por alguns anos”

Confira a entrevista do autor ao DarkBlog

29/10/2025

A faca de Cesar Bravo segue afiada e, quase dez anos depois, o autor retornou aos terrores que marcaram a sua estreia na DarkSide® Books com Ultra Carnem II, a continuação que não apenas confere mais camadas ao “livro do garfo”, mas que completa um novo capítulo na bibliografia maldita do autor.

LEIA TAMBÉM: Cesar Bravo: “Fale pouco, escreva muito, faça o seu melhor”

O lançamento retorna aos personagens que inauguraram o BravoVerso, mas com uma nova visão de Bravo, que chega ao seu sétimo lançamento pela Caveira depois de ter conquistado uma verdadeira legião de fãs, ou de seguidores do seu culto do horror cultivado em solo brasileiro.

Cesar Bravo

Em uma entrevista exclusiva ao DarkBlog, Cesar Bravo fala sobre como tem sido sua jornada como escritor na última década, como foi retornar aos terrores de Ultra Carnem e como o próprio terror nacional mudou de 2016 para cá. Uma conversa para todos que querem conhecer os becos mais escondidos do BravoVerso:

DarkBlog: É claro que vamos começar falando de Ultra Carnem. Seu primeiro livro lida bastante com terrores sobrenaturais, enquanto suas obras seguintes, como a trilogia de Três Rios, optam por se aproximar um pouco mais da realidade, com os horrores causados pela própria humanidade. O que o “possuiu” de volta aos terrores espirituais?

Cesar Bravo: Talvez a arte realmente imite a vida e siga seus mesmos ciclos de revisitação e ressignificação. Eu era um autor e um ser humano bem diferente em Ultra Carnem 2016, mas, de certa forma, o que era mais fundamental em mim e nesse primeiro livro nunca deixou de existir. O apetite pelas conquistas, as dúvidas sobre o outro lado, os fracassos e impedimentos que a vida impõe, e até mesmo as tentações que apenas mudam de roupa para continuarem existindo. Algo que eu não desprezo é minha intuição. Se ela diz “vai”, eu não a questiono. E dessa vez ela gritou. Eu precisei descansar do inferno por alguns anos, afinal de contas, quando você se entrega a esse teor místico, sempre paga um preço. Depois do romance Três Rios, eu voltei a me aproximar das antigas energias, elas falaram comigo, e aqui estamos nós, mantendo a chama sempre acesa.

D: Qual desses horrores lhe causa mais aflição: os do céu, da terra ou do inferno?

CB: Eu tenho um sério problema com a espécie humana, esteja ela onde estiver. A base de minha aflição não são as entidades superiores ou inferiores, mas a experiência humana e nossa fragilidade moral e intelectual. Entre todas as espécies terrestres, o ser humano é uma das poucas que planeja ataques a longo prazo, que arquiteta escravidão, acho que é uma das únicas capazes de exterminar o próprio habitat em uma escala macro. O que me assusta no céu e no inferno é nossa própria concepção desses lugares. Às vezes eu fico imaginando o paraíso e todas as exigências das religiões para que possamos habitar esse lugar e… Deus me livre.

cesar bravo

D: Ultra Carnem II surge quase uma década após a publicação do primeiro livro. Você já tinha esta continuação em mente naquela época ou a decisão de voltar a este universo é recente? O que o levou de volta a esse mundo?

CB: Eu deixei uma pequena abertura para continuação no livro um, mas certos projetos exigem mais tempo e maturidade. Continuar Ultra Carnem naquela ocasião teria sido um erro, eu precisava de mais vida, habilidade e experiência para chegar ao resultado que cheguei nesse momento, precisava me capacitar. Nesse novo trabalho eu adicionei mais camadas a tudo o que semeei anteriormente, e acho que alguns galhos tortos foram podados, para que alguns venenos se tornassem mais concentrados. Por todos esses anos, Ultra Carnem e o peso do espiritualismo continuaram me habitando, principalmente nas figuras de Wladimir Lester, Lucrécia Trindade e minha própria concepção de Lúcifer. Mais do que qualquer outro motivo, esses três personagens nunca pararam de exigir uma continuação. Outro ponto importante é a espécie de fechamento de ciclo que esse livro representa, para que novos ciclos criativos possam surgir. 

D: Antes da publicação de Ultra Carnem você provavelmente tinha uma ideia de como seria a vida de um autor. Nesses quase dez anos, o que se confirmou e o que te surpreendeu sobre o universo literário e trabalhar com escrita em tempo integral?

CB: Nossa, agora vai doer (risos). Existia muita ilusão no começo da carreira, porque a gente tem aquela ideia que ficará “bem de vida” no primeiro ou segundo livro, e que vai se tornar filme e capa de revista e aparecerá nos comerciais da televisão — e não deixa de ser chocante quando a realidade esfrega novos desafios na nossa cara. Por outro lado, eu vivo os dez anos mais felizes de minha vida, hoje tenho tudo bastante equilibrado na vida financeira, e eu não trocaria meu momento atual por nada. Nesse tempo todo conheci grandes irmãos, grandes parceiros, encontrei nos leitores uma nação onde posso morar com orgulho e amor. Descobri até mesmo que sou muito patriota, quando a pátria é o terror, o suspense e a ficção científica. Tive algumas decepções? Claro, mas quem não tem?

Trabalhar com a escrita em tempo integral foi um pedido que fiz ao universo há uns treze, quatorze anos, e graças aos grandes oráculos da DarkSide e aos meus leitores incansáveis o universo me concedeu essa graça. Trabalhar com o que amamos é o que existe de mais recompensante entre os mundos, pode acreditar em mim. E de tudo, de tudo, ver minha filha com os olhos brilhando quando fala do meu trabalho… vou te contar… isso é indescritível.

D: Você varia bastante o seu formato de escrita entre os seus livros, do romance aos contos mais curtos. Tem alguma preferência entre eles? Como cada um deles contribui para o conjunto da sua obra?

CB: Ainda estou me descobrindo na escrita e acho que esse processo está longe de acabar, mas me considero de natureza contista. Hoje não tenho preferência entre os formatos (com uma leve guinada para os romances), mas foram as histórias mais curtas que temperaram o aço da minha escrita. Em um conto não há espaço para rebuscamentos, para engodos, um conto é ou não é. Foi através das histórias mais curtas que desenvolvi meu próprio método de escrever romances, e ele é diferente de tudo o que eu já conheci. Descobri em muitas tentativas e erros que a parte mais divertida do processo é criar sua própria brincadeira, e hoje é assim que faço meus livros, formatando uma regra a cada trabalho. Eu não faço jornadas heroicas, não defino o caráter dos personagens, eu não elejo quem será o personagem principal da história no começo do romance. Tento emular a vida da maneira mais crível possível, uma vida que não aceita regras e é orientada por ações e reações.

D: Depois de quase dez anos e sete livros publicados pela DarkSide, qual é a sensação de revisitar a sua primeira obra? O que mudou de 2016 para você enquanto escritor?

CB: Eu já disse que a DarkSide é meu lar? Pois é. Revisitar Ultra Carnem é pisar novamente na entrada do castelo, mas também é lembrar de onde eu vim, e de tudo o que precisei batalhar para conseguir avançar na carreira e na vida. A sensação ao reler Ultra é como ouvir o primeiro disco de uma banda que você adora. A gente sabe que talvez não seja considerado pelos fãs o melhor disco dentro de toda a discografia, mas isso não muda o que sentimos quando colocamos o volume bem alto e fechamos os olhos.

O que mudou de lá para cá pode ser colocado em algumas palavras: maturidade, autoconfiança e caixa de ferramentas. Hoje em dia me considero um autor mais equilibrado no ofício, com menos exageros desnecessários, e eu consigo me comunicar com as pessoas com muito mais naturalidade e carinho. A caixa de ferramentas também aumentou muito, o que sempre melhora o resultado do trabalho final, mas se você preferir, também posso dizer que hoje eu aprendi novos golpes mortais (risos).

D: O mundo que vivemos hoje é bem diferente do de 2016, quando Ultra Carnem foi publicado. O quanto os eventos da última década influenciaram Ultra Carnem II? De que maneira?

CB: Ultra Carnem mostrou um Brasil que os brasileiros não conheciam. Éramos o povo do abraço, do vem cá meu bem, do jeitinho. No livro, eu mostrei o Brasil da miséria, do desespero, do caos, do preconceito e da falta de confiança. No Ultra Carnem primeiro, meu diabo de 2016 faz arminha com as mãos e defende a liberação do porte de armas e da violência explícita. Hoje o Brasil se conhece melhor. No trabalho, na família, na sociedade como um todo. Hoje o mundo tem outra visão sobre o Brasil.

Algo bastante radical nesse novo livro foi a escolha por novos olhares. Se em Ultra 2016 os ciganos eram vistos de fora para dentro, em Ultra Carnem II nós passamos séculos com eles, ao lado deles, sobrevivendo aos brancos. Foram dez anos conversando com leitores, com ciganos modernos, dez anos de sobrevivência e ressignificação sobre o que é e ao que se propõe o gênero horror. Nesse tempo, também tivemos nossa própria ameaça de extermínio (covid-19) e descobrimos muitos novos infernos navegando pelos meios corporativos. Isso também alterou a maneira como o meu Diabo se comporta e se veste. Eu diria que em Ultra Carnem II ele é menos fogo, e muito mais malícia.

D: Falando em mudanças da última década, como você compara o cenário do terror nacional quando o primeiro Ultra Carnem foi publicado ao dos dias atuais? O que mudou no terror brasileiro de lá para cá?

CB: Hoje nós temos um mercado pulsante de terror, os novos autores têm um caminho com linha de partida e ponto de chegada. Que eu me lembre, era praticamente impossível, até 2015, um autor de horror sobreviver a um ou dois livros publicados de forma tradicional. Isso quando conseguíamos publicar! Agora, sinto outro desafio, que é a capacidade de o mercado acomodar tantos autores talentosos. No Brasil ainda vivemos um fenômeno de mais autores, mais leitores e menos casas editoriais, mas acho que a pressão popular logo irá colocar tudo em equilíbrio, mesmo que para isso nossos autores procurem o caminho da exportação — que parece ser algo recorrente em nossa economia.

D: O que os leitores podem esperar de Ultra Carnem II? Que horrores você pode adiantar para quem está ansioso pela continuação desta história maldita?

CB: O primeiro ponto é um mergulho profundo na vida do povo cigano e na demonologia enraizada em nosso próprio misticismo. Esse livro é centrado na figura de três personagens principais: Wladimir Lester, Lucrécia Trindade e Lúcifer, sendo que os três apresentam novas camadas a cada página virada. Existe também um modelo de negócios expandido do Inferno, uma igreja para Satã e uma galeria de artes dedicada a Wladimir Lester. Também acredito que a carga emocional nesse livro é muito maior. Mais do que isso, acho que serei punido pelos poderes maiores dos censores de spoiler.

D: Você conta com uma legião de fãs que já está bem habituada ao BravoVerso. O que você diria àqueles que vão cruzar essa fronteira pela primeira vez?

CB: “Pague para entrar, reze para sair” (risos). Falando um pouco mais sério, eu diria que os meus livros possuem um horror que sabe carregar o leitor pela mão, que machuca, mas acolhe, e que é, em todos os seus exageros, extremamente plausível. Em meus livros tenho muito cuidado para que os acontecimentos jamais extrapolem as possibilidades aceitáveis, mesmo dentro do universo de ficção proposto. Significa que, por mais que seja uma história inventada, ela é sediada na realidade, em reações reais, então você, leitor, só irá perceber que cruzou a fronteira para o impossível quando for tarde demais. O que o BravoVerso promete é devolver a mágica à sua realidade, e colocar você em um mundo que deixou de existir em meados de 2000. Sabe aquela sensação de um grupo de amigos contando histórias terríveis, tarde da noite, na calçada, quando todos os outros estão dormindo e ninguém quer abandonar o papo? O BravoVerso é isso: essa conversa sussurrada e cheia de arrepios. O olhar para a escuridão quando alguém sugere: “eu vi alguma coisa ali!”.

D: Se você pudesse voltar dez anos no tempo, o que diria ao Cesar Bravo que ainda estava começando essa cruzada pelo universo da escrita?

CB: Eu diria: “meu guerreiro, você não sabe ainda, mas já venceu nessa porra. Seus próximos dez anos serão incríveis, você terá uma vida memorável daqui em diante, fará amigos que não caberão dentro do peito. Então enxuga esse rosto que deu tudo certo. Só não pare de escrever nunca, e jamais decepcione ou pare de acreditar em quem acredita em você. É só desse jeito que, daqui a vinte anos, alguém vai falar comigo com essa mesma confiança no rosto. Oh, e tenha mais paciência de vez em quando se não quiser ter um treco!”

LEIA TAMBÉM: 6 Casos curiosos ligados aos livros de Cesar Bravo

Sobre DarkSide

Avatar photoEles bem que tentaram nos vender um mundo perfeito. Não é nossa culpa se enxergamos as marcas de sangue embaixo do tapete. Na verdade, essa é a nossa maldição. Somos íntimos das sombras. Sentimos o frio que habita os corações humanos. Conhecemos o medo de perto, por vezes, até rimos dele. Dentro de nós, é sempre meia-noite. É inútil resistir. Faça um pacto com quem reconhece a beleza d’ O terror. O terror. Você é um dos nossos.

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