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Qual a ligação entre o BTK e o assassino de A Boa Mentira?

Livro tem semelhanças perturbadoras com a realidade

13/02/2025

“Pessoas comuns, em vidas comuns, podem esconder segredos terríveis”, disse A. R. Torre sobre o seu thriller A Boa Mentira, lançamento da segunda temporada da coleção especial E.L.A.S — Especialistas Literárias na Anatomia do Suspense. Embora o thriller traga uma história fictícia, a autora sabe muito bem que a vida real pode esconder terrores ainda mais perturbadores.

Na história, acompanhamos a psiquiatra Gwen Moore, especialista em assassinos e pessoas com instintos perversos, que passou uma década tratando e desvendando as motivações dos predadores mais depravados da Califórnia. Entre seus pacientes, estão pessoas de personalidade muito parecida com a do serial killer Bloody Heart Killer, ou BHK, o Assassino do Coração Sangrento, procurado pela morte cruel de seis garotos adolescentes.

Após semanas desaparecido, Scott Harden, a última vítima do BHK, consegue escapar de maneira misteriosa de seu cativeiro, e identifica Randall Thompson, professor do ensino médio local, como seu captor. O caso contra Thompson é contundente e já está encerrado, até onde sabem Gwen e a mídia. Se não fosse por uma reviravolta na história…

BTK x BHK: Mais do que uma sopa de letrinhas

DarkSiders entusiastas das publicações Crime Scene e que acompanham casos de true crime provavelmente lembraram de um assassino muito real ao ver as iniciais BHK, pois a semelhança com a alcunha de Dennis Rader está a apenas uma letra de distância. A sigla faz uma alusão aos métodos do assassino, significando bind, torture, kill, ou seja: amarrar, torturar, matar.

O caso de Dennis Rader desperta curiosidade até os dias de hoje pelo fato de ele ter passado tanto tempo sem ser capturado e pelo fato de ele ser o “típico cidadão de bem”, considerado acima de qualquer suspeita — o que lhe deixou impune por cerca de três décadas.

A ideia de existir um predador se escondendo a olhos vistos, convivendo de maneira funcional em sociedade, deu origem a personagens da ficção que também levavam uma vida dupla, como Arthur Miller, o Trinity Killer da série Dexter, e Francis Dolarhyde, de Dragão Vermelho.

O caso chegou a ser abordado brevemente na série Mindhunter, que infelizmente foi interrompida e deixou esse arco da história sem conclusão. Os DarkSiders que quiserem conhecer melhor o caso, têm duas obras indispensáveis nos nossos arquivos Crime Scene: BTK Profile: Máscara da Maldade, que relata a extensa investigação e o envolvimento da imprensa no caso; e BTK: Meu Pai, um relato do ponto de vista de Kerri Rawson, filha de Rader, uma vítima indireta dos crimes do próprio pai.

4 Semelhanças entre o BTK e o BHK, de A Boa Mentira

De volta ao thriller de A.R. Torre, é possível estabelecer alguns paralelos entre Dennis Rader e o Bloody Heart Killer, mostrando que BTK e BHK têm muito em comum:

1. A marca registradas de seus assassinatos

Como dizia sua própria sigla, amarrar, torturar e matar estavam entre os métodos preferidos de Rader para cometer seus crimes. Ele invadia as casas das vítimas, e então as continha e torturava física e psicologicamente antes de matá-las — frequentemente por estrangulamento. Ele obtinha prazer desta dinâmica de poder e às vezes até dava às vítimas alguma esperança, antes de tirar suas vidas.

De modo semelhante, o BHK de A Boa Mentira utilizava métodos específicos e ritualísticos para matar — só não vamos entrar em detalhes para não dar spoilers. O que podemos dizer é que ele também adotava meios sádicos de controlar suas vítimas e exercer domínio sobre elas.

Ambos demonstram uma necessidade de exercer controle sobre suas vítimas e tratam os assassinatos como uma espécie de ritual calculado, e não apenas um crime causado por raiva ou impulso.

2. Frenesi midiático

É até estranho pensar que alguém que conseguiu não ser capturado por cerca de trinta anos gostava tanto da atenção da polícia e da mídia. Dennis Rader chegou a mandar várias cartas para policiais e para a imprensa, detalhando seus assassinatos e debochando das autoridades. Só que foi justamente esse narcisismo e excesso de confiança que causou sua captura, quando ele enviou um disquete à polícia, achando que não poderia ser rastreado. O final da história já conhecemos: Rader foi preso em 2005.

Embora o assassino de A Boa Mentira não seja tão debochado como o BTK, seus crimes também causaram frenesi na mídia e terror na comunidade local. O livro explora justamente o impacto deste temor, mais especificamente como a presença de um serial killer é capaz de manipular tanto o público como aqueles que estão investigando o caso.

Podemos dizer que neste caso ambos jogam com um arsenal psicológico. Enquanto Rader se envolvia diretamente com as autoridades, o BHK de Torre age através do medo, da desinformação e da suspeita de que qualquer um pode ser o assassino. A autora consegue capturar o estrago psicológico que um serial killer causa em seu caminho — algo que também pode ser observado no caso do BTK.

3. Um assassino de vida dupla

Como já mencionamos, um dos aspectos mais chocantes do caso BTK era justamente ele conseguir levar uma vida “normal” — pai de família, líder dos escoteiros e membro ativo da congregação local — enquanto cometia crimes horrendos. Sua capacidade de gerenciar o lado assassino e a sua vida cotidiana foi o que atrasou tanto sua captura.

O mistério central de A Boa Mentira se baseia justamente na ideia de que o BHK poderia ser alguém acima de qualquer suspeita, exatamente como Rader. O dilema da dra. Gwen Moore é justamente em torno da ideia de que o assassino verdadeiro pode estar se escondendo a olhos vistos e que o mal pode existir por trás do rosto mais ordinário.

O aspecto “Médico e Monstro” é crucial tanto na realidade como na ficção. Dennis Rader usou sua posição social para disfarçar seus crimes, enquanto o BHK opera de maneira semelhante, manipulando aqueles no seu entorno para não levantar suspeitas. Essa dualidade é o que os torna tão assustadores: eles não aparentam ser perigosos… pelo menos não até descobrirmos do que são capazes.

4. A psicologia do assassino

Por trás da fachada de Dennis Rader, o BTK preenchia vários requisitos dos perfis de psicopatas assassinos, como narcisismo e tendências sádicas. Ele não apresentava uma verdadeira empatia, vendo suas vítimas como objetos, e não como pessoas. Também demonstrava obsessão pelo controle, não apenas nos crimes, mas no dia a dia. Para completar, Rader acreditava ser mais esperto do que todo mundo e gostava de provocar jogos mentais com a polícia.

A Boa Mentira dedica bastante tempo a explorar a psicologia de assassinos, principalmente a partir da experiência da dra. Gwen Moore. Tal qual Rader, o BHK é um criminoso metódico, emocionalmente desprendido das vítimas e gosta de estar no controle. O livro levanta a questão de podermos prever, compreender ou até mesmo evitar os crimes desses sociopatas.

A representação de A. R. Torre para o assassino BHK se aproxima bastante do que sabemos sobre a mente de Dennis Rader. Ambos os assassinos veem suas vítimas mais como peças de um jogo do que como seres humanos. Torre aborda a ideia de que serial killers podem ser perturbadoramente racionais e inteligentes, o que os torna ainda mais perigosos.