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Conheça Charles Burns: o mestre dos quadrinhos

Uma viagem pela vida e obra do artista que transformou o horror em arte

26/06/2025

Charles Burns é uma espécie de figura mitológica no mundo dos quadrinhos. Há anos que seu trabalho e suas imagens meticulosamente produzidas vêm servindo de inspiração para novos artistas. Sempre com uma carta na manga, cada obra lançada por Burns é rapidamente transformada em um grande evento, mobilizando fãs que aguardam ansiosos por mais uma história. 

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Enquanto isso, Black Hole é considerada sua grande obra-prima. Publicada de forma seriada durante os anos 1990 e compilada em um único volume em 2005, a graphic novel é um terror existencialista ambientado nos arredores de Seattle em meados dos anos 1970, abordando uma praga traiçoeira que se alastra entre adolescentes locais através do contato sexual. Se alguns jovens apresentam apenas indícios sutis da infecção, outros se transformam em aberrações monstruosas, sendo forçados ao autoexílio em acampamentos precários na floresta. Título que inaugurou a marca Graphic Novel da DarkSide® Books, Black Hole apresenta um retrato inquietante da alienação dos tempos colegiais, abordando um momento cultural da história dos Estados Unidos. 

black hole

Black Hole é considerada um divisor de águas na história dos quadrinhos e causou um impacto tão grande que passou a ser ensinada internacionalmente em cursos de literatura inglesa. A partir disso, Charles Burns, que já possuía prestígio na cena alternativa desde os anos 1980, foi alçado ao patamar de herói, sendo frequentemente citado como uma influência para vários artistas, músicos e até mesmo atrizes como Kristen Stewart. Conhecido por ser uma pessoa excepcionalmente amigável, Burns possui uma carreira para lá de variada, com seu nome aparecendo em quadrinhos semanais, capas de álbuns, segmentos da MTV, comerciais de televisão e até mesmo filmes de animação. Conheça a seguir um pouco mais sobre a vida e o trabalho de um dos quadrinistas mais celebrados de todos os tempos. 

Quadrinhos e infância nos anos 1950 e 1960

Charles Burns nasceu em 1955 em Washington D.C. Durante sua infância, sua família mudava bastante de cidade, de forma que o pequeno Charles morou em Maryland, Colorado e Missouri, até se estabelecer em Seattle por volta de 1965. Desde cedo, ele aprendeu a se divertir desenhando, algo que o ajudava com as constantes mudanças ao redor do país. Vale pontuar, que Charles cresceu em uma época bastante conservadora dos Estados Unidos. No final dos anos 1950, Elvis Presley era considerado polêmico e a grande maioria dos pais não gostava que seus filhos tivessem contato com quadrinhos, fruto de um pânico moral que os apontava como capazes de apodrecer o cérebro das crianças. 

Charles Burns

Felizmente, os pais de Charles não acreditavam muito nisso. Seu pai, inclusive, era um grande fã de quadrinhos, apresentando o filho a esse mundo. Um dos primeiros contatos de Charles foi com os quadrinhos do artista belga Hergé, conhecido pelo personagem Tintim, que povoavam as prateleiras do pai. Outro item na coleção que chamava a atenção do garoto eram as reimpressões em preto e branco dos primeiros quadrinhos Mad de Harvey Kurtzman. Quando ficava sozinho em casa – algo bastante frequente, pois sua irmã, três anos mais velha, já frequentava a escola – o pequeno Charles (que ainda nem sabia ler!) se divertia vasculhando os livros da prateleira do pai, encontrando itens e histórias bastante incomuns para alguém da sua idade. 

Enquanto crescia, o garoto começou a desenvolver um interesse por monstros, algo presente até hoje em seu trabalho, consumindo revistas e programas de televisão com a temática Ele passou a devorar revistas de filmes de terror, como a Famous Monsters of Filmland, e a assistir vorazmente produções B, alimentando um amor que se tornaria cada vez mais intenso. Embora tivesse tido contato com quadrinhos desde cedo, tentando recriar ao lado da irmã as artes que encontrava em casa, seu grande despertar aconteceu no início de 1969, quando foi apresentado ao trabalho de Robert Crumb e rapidamente seduzido pelos quadrinhos underground, onde descobriu formas mais adultas e alternativas de contar histórias. Rapidamente, Charles passou a devorar os trabalhos de Crumb e outros artistas como Kim Deitch, Rick Griffin e Victor Moscoso, além de revistas de quadrinhos de terror como a Creepy e a Eerie

Charles Burns

A vida na Califórnia

Incentivado desde cedo a desenhar, não demorou para que Charles decidisse seguir uma carreira na área. Desde o ensino médio, ele sabia que essa era a sua vocação e que ser artista fazia parte de seu senso de identidade. Após ter consumido todos os tipos de quadrinhos, Charles estava finalmente pronto para fazer sua própria arte.

Entre 1973 e 1976, ele estudou gravura na Universidade de Washington em Seattle e na Central Washington State College em Ellensburg. No jornal desta última, Charles publicou uma história em quadrinhos intitulada “Crypto Wander Lust”, além de fundar sua própria revista, a Weepy Gash. Entre 1976 e 1977, estudou fotografia na Evergreen State College em Olympia onde trabalhou na revista do campus, a Cooper Point Journal, sendo responsável por quadrinhos que misturavam humor e horror. 

Big Baby

Após alternar entre diferentes universidades, a grande virada veio em 1977, quando se mudou para cursar pós-graduação em Artes na Universidade da Califórnia. Embora não tenha conseguido um emprego remunerado imediatamente, os anos que viveu no local deram a Charles o estímulo criativo necessário para que começasse sua carreira nos quadrinhos. Tendo contato com a cena punk, que surgiu em São Francisco por volta de 1977, o quadrinista submeteu tirinhas para zines punks e jornais publicitários gratuitos ao redor do país. Após trabalhar em diferentes histórias, em 1980, Burns publicou um quadrinho na revista punk Another Room e ganhou cada vez mais destaque. 

Ao mesmo tempo, Art Spiegelman e Françoise Mouly estavam lançando a revista RAW, a qual mudaria para sempre os quadrinhos underground. Charles viu uma chamada aberta para o primeiro número e decidiu tentar a sorte. O jovem artista chamou a atenção de Spiegelman, que lhe deu a oportunidade de publicar na revista. Em 1981, seu trabalho estreou na terceira edição da RAW e uma edição mais tarde, Charles desenhou sua primeira capa, contribuindo regularmente com a publicação por uma década. Em 1982, ele publicou na RAW sua primeira série, Big Baby, a qual acompanha um adolescente com a cabeça de bebê. Logo em seguida, em 1983, criou outro personagem icônico em sua segunda série, El Borbah, a qual gira em torno de um detetive particular com o visual inspirado nos lutadores mexicanos de luta livre e que vive em um mundo repleto de punks, freaks, cientistas loucos, mutantes e extraterrestres. 

El Borbah

A partir disso, Charles passou a publicar em inúmeras revistas, como a Rolling Stone, a The New Yorker, a Weirdo, a Esquire e até mesmo a Playboy. Nessa mesma época, o quadrinista trabalhou em várias histórias independentes, como Dog Boy, The Voice of Walking Flesh e A Marriage Made in Hell, muitas das quais foram posteriormente reunidas em sua graphic novel Skin Deep, lançada em 2001. O estilo de Charles também o aproximou de sua futura esposa, a artista Susan Moore, com quem se casou em 1982 e teve duas filhas.  

Um período na Europa, os anos 1990 e o novo milênio 

Ao longo da década de 1980, Charles também passou longos períodos na Europa, eventualmente se mudando para a França em 1982 onde publicou na revista Métal Hurlant. Entre 1984 e 1986, viveu em Roma onde se envolveu com o Valvoline de Lorenzo Mattotti, um grupo de quadrinistas de vanguarda. Ao retornar para os Estados Unidos, começou a ensinar arte cômica na Escola de Artes Visuais em Nova York. 

A virada para os anos 1990 trouxe várias mudanças para Charles. No início da década, seu trabalho foi conhecido por um público mais amplo quando a MTV adaptou um de seus quadrinhos, DogBoy, em um segmento live-action do programa Liquid Television. Após uma série de experimentações visuais, em 1995, o artista começou a trabalhar em sua obra-prima, Black Hole, a qual reúne muitos temas explorados anteriormente, como o trauma de adolescentes confrontados com o amadurecimento e a forma pela qual a sexualidade jovem é tratada como um tabu na sociedade norte-americana. Ao longo de uma década, doze edições de Black Hole foram publicadas, sendo que em 2005 a obra foi finalmente reunida em um único volume, lançado no Brasil pela DarkSide® Books. 

black hole

Em 2007, Charles contribuiu com um curta de animação para a antologia de terror francesa Fear(s) of the Dark. Sua história acompanhava um menino assombrado por um estranho besouro com corpo humano. Em 2010, ele lançou a primeira parte de uma nova série, X’ed Out, que gira em torno de um jovem artista que se recupera de uma lesão na cabeça e passa a ser atormentado por intensos pesadelos. Em 2016, a série foi reunida em um único volume, intitulado Last Look

Três anos depois, o artista lançou o primeiro volume de uma nova série de quadrinhos, intitulada Dédales. Após três partes, a série foi reunida em 2024 com o título Final Cut, a qual chegou recentemente na DarkSide® Books. Abordando as obsessões de um artista e os limites da criatividade, a graphic novel gira em torno de Brian Milner, um jovem apaixonado por filmes de terror e desenhos, que mergulha em um mundo de fantasia e delírio quando se afeiçoa por Laurie, sua relutante musa. Uma obra assombrosa e visualmente arrebatadora, Final Cut é uma obra surpreendente sobre as angústias e desejos juvenis, repleta de referências a filmes clássicos de ficção científica e terror, como Invasores de Corpos, baseado na obra homônima de Jack Finney.

final cut

Uma carreira para além dos quadrinhos

Ao longo dos anos, Charles criou uma carreira diversa que se estendeu para além do mundo dos quadrinhos. Em 1983, ano do falecimento de Hergé, ele participou das homenagens feitas pela Fundação Joan Miró em Barcelona, que organizou a grande exposição “O Imaginário de Tintim: Homenagem a Hergé”. Além disso, ficou bastante conhecido por ilustrar a capa de diversas revistas famosas, como a Time Magazine e a The Believer.

Como se isso não fosse suficiente, Charles sempre foi muito procurado pela indústria da música. No início dos anos 1980, ele criou as artes das primeiras mixtapes da Sub Pop, uma gravadora independente localizada em Washington famosa por lançar bandas como Nirvana e Soundgarden. Kurt Cobain, inclusive, se tornou um grande fã de seu trabalho. Já em 1991, ilustrou a capa do álbum “Brick By Brick” de Iggy Pop, trabalhando posteriormente com inúmeros outros artistas do ramo e servindo de inspiração para vários outros.

Brick By Brick

Ainda em 1991, ele foi abordado pelo coreógrafo Mark Morris para criar uma série de ilustrações que serviram de base para uma interpretação modernizada do balé “O Quebra-Nozes” de Tchaikovsky. Em 1993, sua arte foi licenciada pela Coca-Cola para ilustrar as latas e o material publicitário de seu novo produto, o refrigerante OK Soda. Mais recentemente, também trabalhou em campanhas publicitárias da famosa marca de balas Altoids.

Uma mente de criatividade ilimitada

Conhecido por sua consistência em termos de conteúdo, abordagem e estilos, Charles Burns recebeu inúmeros prêmios. Black Hole, por exemplo, rendeu sete Harvey Awards entre 1998 e 2006. Construindo seu nome na cena alternativa dos quadrinhos na década de 1980, Burns rapidamente passou a receber a admiração de artistas como Lynda Barry, Tessa Hulls, Dave Cooper, Matt Groening e Robert Crumb. 

Charles Burns

Afirmando que existe um pouco de si mesmo em cada personagem que cria, Charles Burns é possivelmente um dos maiores quadrinistas de todos os tempos, sendo conhecido por sua criatividade ilimitada. Atualmente, o artista vive na Filadélfia, em uma área industrial conhecida por abrigar artistas e hipsters. Sua casa, assim como seu trabalho, é repleta de monstros e suas estantes cheias de histórias em quadrinhos independentes e de terror.

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Sobre DarkSide

Avatar photoEles bem que tentaram nos vender um mundo perfeito. Não é nossa culpa se enxergamos as marcas de sangue embaixo do tapete. Na verdade, essa é a nossa maldição. Somos íntimos das sombras. Sentimos o frio que habita os corações humanos. Conhecemos o medo de perto, por vezes, até rimos dele. Dentro de nós, é sempre meia-noite. É inútil resistir. Faça um pacto com quem reconhece a beleza d’ O terror. O terror. Você é um dos nossos.

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