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Demonoid: Sua mão esquerda é bem mais do que você pensa

Mãos decepadas, satanagens e o próprio Capiroto

14/11/2024

Todos nós conhecemos o ditado: não se deve julgar um livro pela capa.

Bem, se existe um paralelo dessa máxima no mundo do cinema talvez seja que não devemos julgar uma produção pelo nome, exatamente o que aconteceu com o filme homenageado de hoje.

Demonoid chegou ao mundo em 1981, escrito, produzido e dirigido por Alfredo Zacarias, e baseado na história original do próprio Zacarias. No Brasil, foi comercializado como Demonoid: Mensageiro da Morte. Essa produção mexicana em língua inglesa acabou atraindo críticas negativas em suas primeiras exibições, mas como o deus-tempo nunca perde a chance de se manifestar, com o passar dos anos Demonoid cresceu e alcançou o status de filme cult. Mas vamos mais fundo, literalmente mais fundo nessa história.

Começamos o filme dentro de uma mina, e presenciamos algumas pessoas encapuzadas, pertencentes a uma seita, atacando um dos seus participantes — no caso, uma mulher, que apresenta força sobre-humana. Dominada por vários discípulos, ela é algemada e tem sua mão decepada. A mão, entretanto, continua viva, e é aprisionada em uma espécie de luva de prata, depois de ser apunhalada. Para quem não esperava muito desse filme, é um excelente começo!

Devidamente fisgados, sofremos uma desaceleração e vamos até a cidade de Guanajuato, no México, onde uma mulher, Jennifer Baines, está chegando de viagem para encontrar seu marido. Mark Baines, o marido, trabalha como engenheiro responsável na mina La Quemada. Incauta e ansiosa, Jennifer entra na mina sozinha atrás dele e causa um pequeno desabamento, mas graças a ela, os mineiros encontram vestígios de prata (depois de encontrarem um cadáver com a mão esquerda amputada). Descobrimos a seguir com um dos funcionários, Pepe, que existe uma lenda sobre o a mão esquerda das pessoas ser “a mão do diabo”, e segundo Pepe, foi pela mesma mina de La Quemada que o diabo subiu do inferno pela primeira vez.

Depois do incidente com Jennifer, os trabalhadores se negam a entrar na mina novamente, então ela entra sozinha com Mark, e acessa os níveis mais profundos, a fim de encorajá-los. Dentro da mina, sem uma explicação razoável, o casal decide descer mais e mais, mesmo com as condições terríveis do lugar (as paredes não são sólidas, tudo parece prestes a desabar). Sozinhos, eles se aventuram por áreas onde Pepe não havia levado Mark até então, inclusive para um lugar onde existem várias múmias, e que parece ser uma câmara de tortura. Mark acaba descendo a outro nível depois de um deslizamento de solo, e encontra o que parece ser um templo para Satã. O casal também encontra o receptáculo de prata (tem forma de mão) onde a mão decepada da mulher possuída no começo do filme foi aprisionada. Mark e Jennifer saem com o artefato consigo, para encorajar os mineiros a entrarem e começarem a trabalhar, mas os mineiros abandonam o lugar assim que veem a coisa de prata com eles.

Abandonado por seus homens, Mark retorna ao hotel com Jennifer, e decide encher a cara de champagne para aliviar a pressão. Enquanto está sob as graças do álcool, Mark abre a luva de prata que encontrou na mina, mas tudo o que encontra é poeira. Mais tarde, na mesma noite, enquanto o casal dorme, a poeira se transmuta em uma mão mumificada. A mão toca a perna de Jennifer, que acorda em pânico. Mark a defende e é atacado pela mão (e sim, senhoras e senhores, parece que encontramos uma das fonte onde Sam Raimi bebeu para compor partes de Evil Dead 2). No calor da batalha, a mão volta a ser poeira, mas Mark parece um pouco estranho, desnorteado e assustado, e com uma repulsa instantânea pela luva de prata. Ele deixa Jennifer no quarto e sai do hotel.

Na manhã seguinte, tomado pela loucura, Mark Baines causa uma explosão na mina, para que ninguém mais possa entrar. Seguindo sua espiral da loucura, Mark vai para Las Vegas e se entrega às máquinas de apostas, aos estelionatários e aos inimigos que sua maré de sorte atrai. Quando ele se dá conta de que está possuído pela mão diabólica, Mark pensa em cortá-la, mas ela o incendeia vivo. Mark é encontrado morto e é enterrado, mas a mão consegue tirar ambos da sepultura, e em seguida muda para o corpo de um policial.

A próxima sequência é de uma criatividade ímpar. O caso é que o policial que está com a mão possuída treina box, e o padre que está ajudando Jennifer também treina na mesma academia. Resumindo, o boxeador do demônio enfrenta o boxeador de Deus em uma luta amadora. A coisa não evoluiu ao que esperamos, mas acaba sendo divertido. E falando em diversão, o oficial de polícia se convence de que precisa ter sua mão possuída amputada, então ele sequestra Jennifer, ameaça alguns médicos e consegue a cirurgia de remoção na marra (oh sim: sem anestésicos!).

A mão é decepada, mas ela rapidamente encontra abrigo no médico que realizou a operação. O cirurgião tenta fazer a transferência para Jennifer, que parece ser a escolhida para ser a moradia definitiva da mão esquerda do diabo. Depois que essa informação é relevada, o filme ganha outros contornos, nos quais a mão decepada e as pessoas que ela possui são os grandes oponentes de Jennifer Baines e seu aliado, padre Cunningham. Nesses momentos de perseguição e ataques, é inevitável não pensarmos em Clive Barker e sua história genial “A Política do Corpo”, presente no quarto volume de Livros de Sangue, e que inclusive rendeu uma adaptação.

Com bons atores, efeitos práticos convincentes, imagens impactantes e uma trama que desafia a lógica mas se mantém fiel à sua premissa inicial, Demonoid envelheceu muito bem, e é perfeitamente compreensível o motivo pelo qual acumulou uma legião de admiradores tardios. O filme ainda bebe seus goles de The Exorcist, The Omen, e de uma série de outros filmes que trouxeram o oculto e o profano para as salas de cinema e as mesas de jantar. Flertando com elementos reconhecidamente satânicos e com uma mitologia própria, Demonoid certamente pode dar uma mãozinha no seu gosto por filmes de horror antigos.

E ainda temos uma participação especial da Macabra, no México, onde o filme se chama Macabra: La mano del diablo.