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Entrevista com o Vampiro: O livro, o filme, a série

A obra e o legado de Anne Rice na mitologia vampírica

10/12/2024

Quando o assunto são vampiros, poucos nomes são tão emblemáticos quanto Anne Rice. Ao lado de escritores como Bram Stoker e Sheridan Le Fanu, Rice foi responsável por redefinir a imagem do vampiro na cultura pop e criar alguns dos sanguessugas mais memoráveis da literatura e do cinema.

Nascida em 4 de outubro de 1941, em Nova Orleans, Anne Rice começou sua carreira literária em 1976, publicando aquela que viria a ser sua obra mais famosa: Entrevista com o Vampiro, responsável por apresentar ao mundo o icônico vampiro Lestat. Ao longo de sua prolífica vida como escritora, ela ainda se tornaria a criadora de outros personagens lendários, como Akasha e as bruxas de Mayfair, que continuam fascinando até hoje milhares de leitores.

Considerada uma das autoras mais emblemáticas do gótico, muitas vezes creditada como a responsável por reinventar o gênero no século XX, Anne Rice deixou sua marca vampírica não apenas no pescoço da literatura mundial, mas também no cinema e na televisão. Em Anne Rice: Biografia Vampírica os leitores têm a chance de mergulhar na vida da escritora, conhecendo sua extraordinária jornada, assim como suas influências e inspirações. Lançamento da DarkSide® Books, escrita pela jornalista Katherine Ramsland, Anne Rice: Biografia Vampírica é a única biografia autorizada desta autora imortal, uma mistura de pesquisa meticulosa com narrativa envolvente que oferece um olhar íntimo sobre a vida de Rice e os elementos que perpassam suas obras.

Para celebrar a vida e o legado de Anne Rice, que infelizmente nos deixou em 2021, embarque com a Caveira nesta recapitulação de uma de suas obras mais famosas, Entrevista com o Vampiro, que recentemente foi transformada em série pelo canal de televisão AMC.

Nasce uma lenda vampírica: o livro

Publicado em 1976, o romance de estreia de Anne Rice, Entrevista com o Vampiro, trazia uma perspectiva inovadora para o mundo desses seres imortais. Centrado em Louis de Pointe du Lac, o livro tem como estrutura uma entrevista que o vampiro de 200 anos concede a um repórter, em que narra sua vida antes e depois da imortalidade, sua relação com o vampiro Lestat de Lioncourt, a chegada da “filha” dos dois, a vampira Claudia, e todos os seus questionamentos sobre humanidade, espiritualidade, identidade e imortalidade.

Embora tenha sido publicada em 1976, a história por trás de Entrevista com o Vampiro começa muito antes, estando intimamente conectada com a vida pessoal de Anne Rice. Em 1970, enquanto cursava uma pós-graduação em Escrita Criativa, sua filha Michele, então com 4 anos de idade, foi diagnosticada com leucemia mieloide aguda. Infelizmente, dois anos depois, pouco antes de comemorar seu sexto aniversário, Michele faleceu e Rice passou a enfrentar uma profunda depressão.

Em 1973, ainda sofrendo pela perda da filha, ela decidiu recuperar um despretensioso conto que havia escrito alguns anos antes. Com cerca de trinta páginas, a história era escrita a partir da perspectiva do entrevistador e, encorajada pelo marido, Rice decidiu transformá-la em um romance. Inspirada pela Condessa Marya Zaleska, interpretada por Gloria Holden em A Filha de Drácula (1936), a escritora posteriormente contou que o filme lhe mostrou que vampiros eram seres elegantes, trágicos e sensíveis, sentimento que a guiou enquanto escrevia Entrevista com o Vampiro. Rice demorou cerca de cinco semanas para completar o livro de quase 400 páginas.

Entretanto, o caminho para a publicação ainda seria bastante longo. Após sofrer rejeição de inúmeros editores, que não consideravam que a obra seria um sucesso, Rice desenvolveu transtorno obsessivo-compulsivo (TOC), ficando atormentada pela possibilidade de ser contaminada por germes e doenças. Após permanecer afastada por quase um ano do mercado editorial, em agosto de 1974, ela participou de uma conferência na Califórnia onde conheceu sua futura agente literária, Phyllis Seidel. Em outubro daquele mesmo ano, Seidel vendeu os direitos de publicação de Entrevista com o Vampiro para a editora Alfred A. Knopf por um adiantamento de 12 mil dólares. Era um feito impressionante na época, considerando que a maioria dos novos autores recebia cerca de 2 mil dólares de adiantamento.

Finalmente, em abril de 1976, Entrevista com o Vampiro chegou às prateleiras das livrarias. Contudo, a obra não foi um sucesso imediato e as críticas foram mistas, com alguns críticos exaltando a escrita poética de Rice e outros repreendendo o erotismo presente no livro. Embora não tenha sido inicialmente o grande sucesso esperado, Entrevista com o Vampiro gradualmente conquistou os fãs e se tornou um fenômeno literário, abrindo as portas para a série literária Crônicas Vampirescas, composta por nada mais, nada menos do que treza obras.

Em 1985, Rice publicou a primeira sequência de Entrevista com o Vampiro: O Vampiro Lestat, o qual vendeu mais de 75 mil cópias em sua primeira edição. Em 1988, a autora publicou o terceiro livro da série, A Rainha dos Condenados, que liderou a lista dos mais vendidos do New York Times e recebeu uma impressionante primeira tiragem de mais de 400 mil cópias.

Nos anos 1990, Anne Rice já era uma autora consolidada do gênero, conquistando sucesso não apenas com as Crônicas Vampirescas, mas também com a série literária das Bruxas de Mayfair. Era uma questão de tempo até o universo vampiresco da autora finalmente chegar aos cinemas.

Beba de Mim e Viva Eternamente: o filme

Em abril de 1976, pouco antes da publicação do livro, os direitos de Entrevista com o Vampiro foram adquiridos pela Paramount Pictures. Contudo, o roteiro acabou preso por anos no chamado “inferno de desenvolvimento”, passando pelas mãos de inúmeros estúdios até que seus direitos foram vendidos para a The Geffen Film Company e para a distribuidora Warner Bros., que nos anos 1990 chamou o diretor Neil Jordan, conhecido pelo longa Traídos pelo Desejo, para comandar o projeto.

Após ler o romance de Anne Rice, Jordan ficou imensamente interessado pela história, principalmente pela temática da culpa católica, concordando em dirigir sua adaptação desde que pudesse contribuir com o roteiro, o qual já havia sido escrito por Rice anos antes. Com produção de David Geffen e Stephen Woolley, o projeto recebeu um orçamento de cerca de 70 milhões de dólares, algo sem precedentes para o gênero de vampiros e ultrapassando até mesmo o orçamento de Drácula de Bram Stoker (1992), uma grande influência para a adaptação de Entrevista com o Vampiro.

Com o dinheiro garantido, era hora de escolher os atores que dariam vida aos icônicos personagens. Anne Rice e os fãs do livro defenderam o ator britânico Julian Sands para o papel de Lestat. Como Sands não era um nome muito conhecido na época, ele foi vetado pelos produtores e o papel foi dado a uma grande estrela de Hollywood: Tom Cruise, queal recebeu um salário recorde pela participação no filme, além de uma porcentagem de lucros. Embora Rice tenha criticado a escalação de Cruise, inclusive recomendando outros autores para o papel, ela eventualmente ficou satisfeita com a atuação, inclusive ligando para elogiá-lo e admitir que estava errada.

O papel de Louis acabou ficando com Brad Pitt, e Antonio Banderas tornou-se o encarregado de dar vida a Armand. Originalmente, o jornalista Daniel Molloy seria vivido por River Phoenix, que infelizmente faleceu quatro semanas antes das filmagens começarem. Quando Christian Slater assumiu o papel, o ator doou seu salário para as instituições filantrópicas ajudadas por Phoenix, a quem o filme é dedicado. Enfim, para dar vida à pequena Claudia (inspirada em Michele, a filha de Rice) a produção encontrou uma atriz desconhecida de dez anos, Kirsten Dunst. O papel de Claudia era especialmente desafiador e Dunst causou uma impressão tão forte nos produtores, que após inúmeros testes, eles decidiram retornar para a jovem atriz.

Em outubro de 1993, a maior parte das filmagens já haviam sido concluídas, alternando entre Nova Orleans, Londres, São Francisco e Paris. Faltando apenas algumas cenas envolvendo o jornalista Daniel Molloy, a produção acabou paralisada para esperar o ator River Phoenix, que estava finalizando sua participação em outro longa. Com a trágica morte de Phoenix no final do mês, a produção de Entrevista com o Vampiro correu contra o tempo e escalou Slater para o papel de Molloy. Na fase de pós-produção, os efeitos visuais e a maquiagem ficaram nas mãos da equipe de Stan Winston, bastante conhecido pelos trabalhos em Exterminador do Futuro, Batman: O Retorno e Jurassic Park.

Um ano depois, em novembro de 1994, ao som de “Sympathy for the Devil”, a adaptação cinematográfica de Entrevista com o Vampiro finalmente chegou às telonas. Recebendo críticas em sua maioria positivas, o filme foi um sucesso de público e bilheteria, arrecadando mais de 220 milhões de dólares no mundo todo e cravando a 11ª posição na lista de maiores bilheterias do ano.

Embora seja frequentemente considerada uma interpretação e versão do romance de Anne Rice, em vez de uma adaptação, o sucesso do filme também veio na temporada de premiações. O longa recebeu duas indicações ao Oscar, por Melhor Direção de Arte e Melhor Trilha Sonora. A jovem Kirsten Dunst ainda foi nomeada a um Globo de Ouro de Melhor Atriz Coadjuvante por sua atuação. O sucesso de Entrevista com o Vampiro ainda levou à adaptação de outro romance de Rice em 2002, A Rainha dos Condenados, que não obteve a mesma aclamação.

Uma nova versão do clássico imortal: a série

Em 2014, a Universal Pictures, junto com a Imagine Entertainment, adquiriu os direitos cinematográficos das Crônicas Vampirescas, indicando o nascimento de uma franquia cinematográfica. Em 2016, o roteirista Josh Boone postou no Instagram uma foto do roteiro da nova adaptação de Entrevista com o Vampiro, o qual englobaria não apenas o romance, mas também sua sequência, O Vampiro Lestat. Contudo, em novembro daquele ano, a Universal não renovou os direitos, os quais foram devolvidos para Anne Rice, que declarou a intenção de transformar a história em uma série de televisão.

Após essa e várias outras frustrações, como uma guerra de licitações que não levava a nenhum desenvolvimento concreto, parecia que a franquia ficaria parada por um bom tempo. Até que em 2020, foi anunciado que o canal AMC havia comprado os direitos das Crônicas Vampirescas e das Bruxas de Mayfair para desenvolver projetos tanto no cinema quanto na televisão.

Em 2021, a AMC autorizou a produção de uma série com sete episódios de Entrevista com o Vampiro. Desenvolvida por Rolin Jones e com produção executiva de Mark Johnson e Alan Taylor, a série estreou em 2 de outubro de 2022, sendo amplamente elogiada. Com Jacob Anderson como Louis e Sam Reid como Lestat, a primeira temporada começa em 2022 quando o vampiro Louis de Pointe du Lac conta sua história ao jornalista veterano Daniel Molloy, vivido por Eric Bogosian, a quem já havia dado uma entrevista inédita em 1973. Desta forma, o presente da série se passa quatro décadas após a entrevista original descrita na obra de Anne Rice, funcionando tanto como uma adaptação quanto como uma sequência.

Em alguns aspectos, Entrevista com o Vampiro retoma de onde o filme de 1994 terminou, marcando o encontro de Molloy e Louis anos depois em Dubai, de forma que o jornalista apenas consegue publicar a entrevista após esse segundo encontro. Contudo, quando Louis começa a mais uma vez lembrar sua história, o senso de continuidade com o longa de 1994 é quebrado, já que os personagens são diferentes de sua versão cinematográfica — e até mesmo de seu protótipo literário. Entre idas e vindas no tempo, a série perpassa a vida de Louis enquanto um rico homem negro na Nova Orleans do início do século XX, seu romance com Lestat, seu relacionamento com Armand (Assad Zaman), e a chegada da vampira adolescente Claudia, interpretada por Bailey Bass na primeira temporada e por Dalainey Hayles na segunda.

Embora traga muitas mudanças em termos de tempo, logística e cenário, a série de Entrevista com o Vampiro mantém-se fiel em espírito à obra de Anne Rice, com muitos diálogos sendo tirados diretamente de suas páginas. As alterações na linha do tempo e na ordem dos acontecimentos, por exemplo, permitem que a série explore novos contextos históricos e temas-chave do romance de Rice, desenvolvendo também as relações entre os personagens e abordando questões importantes como raça, sexualidade e abuso. Enquanto o filme de 1994 precisou comprimir os eventos do livro em uma duração de duas horas, a série se beneficiou imensamente do formato episódico, conseguindo mergulhar nas complexidades do universo e dos indivíduos criado por Rice.

Entre as mudanças mais significativas da série em relação ao filme está o fato de que nela Louis é transformado de um homem branco, proprietário de uma fazenda escravagista na Louisiana de 1791, para um homem negro dono de um bordel na Nova Orleans da década de 1910. Outras alterações envolvem a idade de Claudia e também o aumento da importância de Daniel Molloy na trama. Contudo, o mais significativo é como a série abraça a questão da sexualidade e a relação queer que existe entre os personagens, tornando a tóxica relação de amor-ódio entre Louis e Lestat algo explicitamente romântico e sexual.

Assim como no livro de Anne Rice, a série mantém Nova Orleans como o palco central de eventos, adicionando um novo cenário importante para a trama, Dubai, o local onde a nova entrevista acontece. Desta forma, Entrevista com o Vampiro consegue honrar o romance original ao mesmo tempo em que traz novos e emocionantes ares para uma história já bastante conhecida.

A série foi bastante elogiada por seu roteiro, figurino, design de produção e performances. Em 2022, a AMC renovou para uma segunda temporada, que estreou em maio de 2024 com oito episódios adaptando a segunda metade do romance homônimo de Rice e utilizando alguns elementos do segundo livro das Crônicas Vampirescas. A terceira temporada já foi confirmada e utilizará como base O Vampiro Lestat, publicado originalmente em 1985.

Vale mencionar que Entrevista com o Vampiro foi a primeira série do Universo Imortal da AMC, que engloba outras adaptações televisivas de obras de Anne Rice. Em 2023, o canal trouxe a série das Bruxas de Mayfair, que já teve mais uma temporada confirmada, e 2025 está previsto com uma produção sobre a sociedade secreta de Talamasca, a qual aparece tanto no universo das Crônicas quanto no de Mayfair.

Uma obra imortal de uma autora imortal

Enquanto Anne Rice se mostrou bastante envolvida com a produção cinematográfica de 1994 de Entrevista com o Vampiro, infelizmente ela não chegou a ver a adaptação do romance para as telinhas. A autora faleceu um ano antes, em dezembro de 2021, aos 80 anos, deixando um legado imensurável na literatura.

Agora você pode embarcar em um passeio guiado pela vida da criadora de Louis, Lestat e Claudia em Anne Rice: Biografia Vampírica. Por meio de entrevistas com amigos, familiares e colegas, a jornalista investigativa Katherine Ramsland oferece um raro e íntimo olhar sobre a autora, passando de sua infância em Nova Orleans até sua consolidação como um dos grandes nomes da literatura contemporânea. Mergulhando em motivações e conexões com personagens mais memoráveis, Ramsland revela ao leitor o processo criativo de uma autora que transcende os limites da vida e da morte.