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A relação entre A Volta do Parafuso e a Maldição da Mansão Bly

Semelhanças, diferenças e referências da produção de Mike Flanagan

06/02/2024

Além de ser conhecido por suas produções originais, Mike Flanagan chama a atenção por reimaginar com maestria e criatividade obras literárias famosas. Em 2017 e 2019, por exemplo, o diretor levou para as telas duas histórias do mestre Stephen King em Jogo Perigoso e Doutor Sono. No entanto, o auge veio em 2018, com um contrato para produzir cinco minisséries de terror para a Netflix. 

LEIA TAMBÉM: A QUEDA DA CASA DE USHER: A RELAÇÃO DA SÉRIE DA NETFLIX COM A OBRA DE EDGAR ALLAN POE

Entre 2018 e 2023, Flanagan assumiu a difícil tarefa de reimaginar e expandir o universo de clássicos literários, como A Assombração da Casa da Colina de Shirley Jackson, A Queda da Casa de Usher de Edgar Allan Poe e A Volta do Parafuso de Henry James. Este último foi transformado na minissérie A Maldição da Mansão Bly, lançada em 2020. 

Publicada em 1898 pelo escritor Henry James, A Volta do Parafuso é considerada uma das maiores histórias de fantasmas de todos os tempos. Clássico da literatura de terror, a obra relata as desconcertantes experiências de uma mulher encarregada de cuidar de duas crianças órfãs em uma isolada propriedade rural. Escrita como um manuscrito de memórias, a história nos leva de forma intimista para dentro da misteriosa mansão Bly. 

Mais de um século depois de sua publicação original, A Volta do Parafuso finalmente chegou na DarkSide® Books para integrar a marca Medo Clássico. A obra, que foi adaptada algumas vezes para o cinema e televisão, agora faz parte da estante da Caveira em uma edição traduzida por Luci Collin e ilustrada pelo premiado artista Marco Mazzoni.

a volta do parafuso

Que A Volta do Parafuso é um clássico nós já sabemos. No entanto, é interessante refletirmos como atualmente a obra é automaticamente associada ao fenômeno criado por Mike Flanagan em 2020. A Caveira conta um pouco mais das semelhanças e diferenças entre A Volta do Parafuso e A Maldição da Mansão Bly.

A volta da Mansão Bly

A Maldição da Mansão Bly chegou na Netflix em outubro de 2020. Seguindo os passos de sua antecessora, A Maldição da Residência Hill, a minissérie de nove episódios utiliza uma história clássica como ponto de partida. Enquanto Residência Hill reimaginava o romance homônimo publicado em 1959 por Shirley Jackson, Mansão Bly utilizou A Volta do Parafuso como um “esqueleto temático” para costurar outras histórias escritas por Henry James. Em 2023, Flanagan faria algo similar em A Queda da Casa de Usher, dessa vez com os trabalhos de Edgar Allan Poe. 

Mansão Bly parte então do enredo de A Volta do Parafuso, em que uma governanta é atormentada por visões e experiências sobrenaturais enquanto cuida de duas crianças em uma remota casa de campo. Aqui já surgem duas diferenças entre a obra e a minissérie. Enquanto A Volta do Parafuso deixa seus leitores decidirem por si mesmos se existe ou não algo sobrenatural no local, em Mansão Bly não há como negar que presenças fantasmagóricas circulam pela mansão.

a maldição da mansão bly
Netflix/Reprodução

Outro ponto de divergência é que na história de Henry James a governanta, que nunca é nomeada, é um exemplo clássico de narrador não confiável. Um dos charmes do romance é o fato de nunca podermos confiar inteiramente em sua versão dos eventos. Já na história de Flanagan, a personagem, interpretada por Victoria Pedretti, ganha mais credibilidade, deixando de ser a narradora e sendo reimaginada como Dani Clayton, uma babá americana contratada para cuidar dos irmãos Flora e Miles. Grande parte dos eventos são construídos ao seu redor, assim como de seus traumas e relacionamentos com os funcionários de Bly, especialmente a jardineira Jamie.

Do século XIX para a década de 1980

Flanagan transporta a obra de James para o ano de 1987. No entanto, apesar das diferenças, tanto a minissérie quanto o livro começam de formas bastante similares. O primeiro episódio de Mansão Bly traz A Narradora, interpretada por Carla Gugino, contando a história para os convidados de um casamento. Já em A Volta do Parafuso, esse momentos iniciais ocorrem durante véspera de Natal quando alguns amigos se reúnem em volta de uma fogueira e um deles lê o manuscrito de uma mulher já falecida. 

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Enquanto o primeiro narrador de A Volta do Parafuso nunca presenciou os eventos e está apenas repassando um relato, a narradora de Mansão Bly é revelada posteriormente como Jamie, uma das funcionárias da propriedade e o interesse amoroso de Dani. Além de fornecer um desfecho mais direcionado ao espectador, essa alteração também elimina a narradora não confiável presente no livro, algo que poderia ser difícil de adaptar em uma minissérie. 

a maldição da mansão bly
Netflix/Reprodução

Várias histórias em uma só narrativa

Por mais que A Volta do Parafuso forneça o eixo narrativo e o tom da minissérie, alguns momentos e explicações são retirados de outras histórias de Henry James. Para começo de conversa, todos os nove episódios de Mansão Bly são nomeados em homenagem a outras histórias do autor americano. 

Além disso, para fornecer histórias de fundo para personagens importantes da trama, Flanagan se baseia em dois contos. No sexto episódio, intitulado de “Cantos Secretos”, descobrimos o triste passado do tio Henry, interpretado por Henry Thomas. Enquanto em A Volta do Parafuso o personagem é apenas o tio distante das crianças, em Mansão Bly ele ganha uma melancólica história marcada pelo caso extraconjugal com a cunhada, por quem se apaixona. Desde a morte do irmão e da cunhada, Henry é assombrado por seu próprio doppelgänger. A temática do arrependimento vem do conto “The Jolly Corner”, onde um homem é assombrado pelo fantasma de quem poderia ter sido caso tivesse tomado decisões diferentes em sua vida. 

Já duas importantes fantasmas da trama, as irmãs Viola e Perdita, são retiradas do conto “The Romance of Certain Old Clothes”, que dá nome ao oitavo episódio, apresentado inteiramente em preto e branco. Aqui Mansão Bly fornece a explicação de como a mansão se tornou assombrada, apresentando uma “atração fantasmagórica gravitacional” na propriedade, algo que não existe em A Volta do Parafuso

a maldição da mansão bly
Netflix/Reprodução

As personagens são extraídas do conto publicado em 1868 e a minissérie oferece uma adaptação bastante direta da história ambientada no século XVII sobre duas irmãs apaixonadas pelo mesmo homem. Quando uma delas morre, a outra se casa com o viúvo e abre um baú cheio de vestidos e joias da falecida, passando a ser assombrada por seu fantasma. Contudo, apesar da inspiração, Mike Flanagan dá seu próprio toque, invertendo o nome das irmãs e fornecendo ao fantasma de Viola um papel muito mais importante e único na trama. 

Novos e antigos personagens

Já que o assunto são fantasmas e personagens melancólicos, Mansão Bly está cheia deles. Alguns foram retirados de outras obras de Henry James, enquanto outros vieram diretamente de A Volta de Parafuso. No entanto, há ainda aqueles que foram criados unicamente para a minissérie. 

O cozinheiro Owen, interpretado por Rahul Kohli, e a jardineira Jamie, vivida por Amelia Eve, foram criados para Mansão Bly. As duas adições estabelecem importantes relações com personagens já existentes e contribuem para o arco geral da história. Além disso, ao serem apresentados como interesses românticos, ambos fornecem narrativas significativas para a governanta Hannah Grose e a babá Dani.

a maldição da mansão bly
Netflix/Reprodução

Vale ressaltar, que em A Volta do Parafuso, Hannah é apenas a sra. Grose, uma confidente da narradora quando esta passa a notar estranhos acontecimentos na mansão. Em Mansão Bly, descobrimos muito mais da personagem, assim como também somos confrontados com uma revelação dramática sobre seu destino, o qual não aparece no livro. 

Na verdade, quase todas as narrativas sobre os passados dos personagens são novidade da série. Exemplo disso envolve a própria protagonista. Seu noivado, o destino trágico do noivo e o romance com Jamie são adições da Mansão Bly. Por consequência, isso quer dizer que o assustador homem no espelho não existe em A Volta do Parafuso, já que a governanta não divide muito de sua vida e não sabemos quase nada sobre ela. 

O grande desfecho

A maior diferença entre a obra de Henry James e a minissérie de Mike Flanagan se situa justamente no final. Mansão Bly opta por entregar uma história de amor entrelaçada a uma de fantasmas, centrando o desfecho em três personagens: Viola, Dani e Jamie. Ao focar no amor entre Dani e Jamie, Flanagan conclui Mansão Bly com uma melancólica e dolorosa nota de esperança, que captura bem a essência da minissérie. 

a maldição da mansão bly
Netflix/Reprodução

Contudo, não é bem isso o que acontece em A Volta do Parafuso. Embora a obra também condense temáticas como amor, inocência, forças do mal e morte, aqui os eventos tomam um rumo bastante diferente. Basta lembrar, por exemplo, que no livro de Henry James as personagens Jamie e Viola não existem

Mas pode ficar tranquilo que a Caveira não vai estragar sua experiência com spoilers. O surpreendente desfecho de A Volta do Parafuso está a poucas páginas de distância e os DarkSiders podem vivenciar toda a magnitude dessa obra-prima da literatura de terror.

Uma história de amor e uma história de fantasmas

Enquanto Mansão Bly é definitivamente uma história, ou melhor, várias histórias de amor com elementos sobrenaturais, A Volta do Parafuso permanece enraizada na clássica história de fantasmas, gênero o qual ajudou a consolidar ainda mais. A minissérie de Mike Flanagan capta a essência da obra literária, ao mesmo tempo em que expande e reimagina muito de seu universo.

a maldição da mansão bly
Netflix/Reprodução

Apesar das diferenças, inevitáveis quando o assunto é qualquer tipo de adaptação, ambas as obras, separadas por mais de um século, transmitem com maestria um sentimento de melancolia inerente em qualquer história de fantasma. Seja assistindo a Mansão Bly ou lendo A Volta do Parafuso, é impossível não terminar o enredo sentindo alguma relação ou reflexão com os eventos que aconteceram. Como o próprio Mike Flanagan expressou, não se trata apenas de uma história sobre um local assombrado, mas também de uma história sobre pessoas assombradas

E no fundo, alguns mais, outros menos, todos nós somos assombrados por algo ou alguém.

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Sobre DarkSide

Avatar photoEles bem que tentaram nos vender um mundo perfeito. Não é nossa culpa se enxergamos as marcas de sangue embaixo do tapete. Na verdade, essa é a nossa maldição. Somos íntimos das sombras. Sentimos o frio que habita os corações humanos. Conhecemos o medo de perto, por vezes, até rimos dele. Dentro de nós, é sempre meia-noite. É inútil resistir. Faça um pacto com quem reconhece a beleza d’ O terror. O terror. Você é um dos nossos.

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