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Caveira Viu: Nosferatu

O fascinante pesadelo gótico de Robert Eggers

07/01/2025

Publicado pela primeira vez em 1897, o romance Drácula do irlandês Bram Stoker foi responsável por apresentar ao mundo não apenas um, mas dois vampiros icônicos. Muito antes de Bela Lugosi dar vida ao conde homônimo em 1931 na produção da Universal Pictures, um pequeno filme alemão de 1922 intitulado Nosferatu chegou nas telonas para deixar sua marca na história do cinema de horror. 

LEIA TAMBÉM: Diferenças e semelhanças nas adaptações do terror clássico

Dirigido por F.W. Murnau, o longa era uma adaptação não autorizada do romance de Stoker. Para tentar contornar questões legais, Nosferatu optou por diferentes saídas criativas, modificando nomes, lugares e outros detalhes presentes em Drácula. Esse esforço artístico não apenas conferiu uma personalidade própria ao filme, como também propiciou uma independência em relação ao material de origem, abrindo as portas para uma série de adaptações e refilmagens próprias. Longe de ficar à sombra do Conde Drácula, o Conde Orlok de Nosferatu conquistou um lugar para chamar de seu junto aos monstros icônicos do horror. 

Não foi nenhuma surpresa então quando foi anunciado que o diretor de A Bruxa, Robert Eggers estava trabalhando em uma nova versão de Nosferatu. Após alguns anos de incerteza, o filme finalmente estreou nos cinemas brasileiros em janeiro deste ano, contando com um elenco liderado por Lily-Rose Depp, Bill Skarsgård e Nicholas Hoult.

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Mesmo com críticas positivas, a nova versão parece assombrada pela difícil questão enfrentada por praticamente todas as adaptações de histórias clássicas: afinal, ainda resta algo a ser contado? A Caveira já assistiu ao filme e tem um veredito para você.

Abrace a escuridão 

A história de Nosferatu começa anos antes, com a protagonista Ellen (Lily-Rose Depp), implorando desesperadamente por um espírito invisível que alivie sua profunda solidão. Seu pedido é respondido, mas não pelo anjo que a jovem espera, mas por um mal ameaçador que cria entre os dois um vínculo praticamente indestrutível de morte, obsessão e desejo.

Anos depois, Ellen vive na cidade de Wisborg, na Alemanha, aparentemente tendo encontrado conforto e salvação com seu novo marido, Thomas Hutter (Hoult). No entanto, a felicidade dos recém-casados é interrompida quando Thomas é enviado para uma terra distante para fechar um negócio com o recluso e excêntrico Conde Orlok (Skarsgård). 

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Diferentemente de Drácula de Bram Stoker, dirigido por Francis Ford Coppola em 1992, Nosferatu não é uma história de amor. Muito pelo contrário. Embora a narrativa seja apresentada como um triângulo amoroso macabro, Orlok não é capaz de sentir amor ou qualquer outra emoção tenra.

Longe de ser charmoso (tal qual Gary Oldman na adaptação de 1992), o Strigoi é um ser repulsivo e pestilento, um cadáver ambulante em estado de putrefação, capaz de destruir a tudo e a todos para saciar sua sede de sangue e luxúria. Essa construção do personagem — conduzida por um irreconhecível Bill Skarsgård — resulta em cenas desconfortáveis e profanas, que representam magistralmente a antiga união entre o horror e o sexo, algo central em narrativas góticas.

Isso também é materializado na personagem de Ellen, a outra ponta desse triângulo amoroso, atormentada por estranhas premonições, surtos de melancolia e violentas convulsões que surgem ao anoitecer. Aqui, de forma bastante literal, o corpo feminino é o locus de um desejo perigoso e profano. É no corpo de Ellen que se encena a batalha entre o bem e o mal, mas é também nele que se expressa o conflito da própria personagem com as trevas que existem dentro de si, com as normas sociais que lhes são impostas e com seus próprios e aterrorizantes desejos. 

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O tema do desejo abusivo transforma Nosferatu em uma tragédia gótica psicossexual deslumbrante, uma trama melancólica sobre solidão, desespero e sofrimento acompanhada por sangue e necrofilia. Visualmente, o filme de Robert Eggers é impecável, marcando mais uma parceria do cineasta com o diretor de arte Craig Lathrop e com o diretor de fotografia Jarin Blaschke.

Uma ode aos clássicos do horror gótico, as cenas noturnas surgem como pesadelos monocromáticos e os cenários requintados contribuem com o tom dramático e sombrio da narrativa. O trabalho de câmera, o jogo de luz e sombra, o figurino e o design de produção contribuem para que Nosferatu surja como um fascinante pesadelo gótico

O que ainda resta a ser contado?

Mesmo com todos os seus méritos, o filme de Robert Eggers não consegue escapar da armadilha imposta a qualquer nova versão de um clássico, permanecendo atrelado ao que já foi feito anteriormente e perdendo a oportunidade de descolar sua própria personalidade e trilhar novos caminhos narrativos. De certa forma, parte do impacto da produção de 2024 é perdida quando a comparamos com a versão de 1979, Nosferatu – O Vampiro da Noite, dirigida por Werner Herzog e estrelado por Klaus Kinski e Isabelle Adjani. 

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É a partir dessas inevitáveis comparações que percebemos o quanto o filme de Eggers poderia ter enveredado por um caminho diferente, contando uma história nunca antes vista e quem sabe se descolando de seu original, tal qual o filme de F.W. Murnau fez em relação ao romance de Stoker mais de um século atrás. Algo que não seria difícil considerando o elenco reunido pelo cineasta.

Ao permanecer preso a algo já conhecido e consolidado, Nosferatu não aproveita plenamente seu elenco de apoio, marcado por nomes de peso como Willem Dafoe, Ralph Ineson, Aaron Taylor-Johnson e Emma Corrin, assim como também não desenvolve de fato as discussões como autonomia, deslocamento, desejo e expectativas sociais, as quais são meramente levantadas a partir da personalidade e do sofrimento de Ellen. É possivelmente aqui que o longa perde a oportunidade de esculpir sua própria personalidade.

Apesar de tudo, entre prós e contras, Nosferatu ainda se destaca como um bom filme, apresentando ideias dramáticas e um poderoso plano final. O quarto longa de Robert Eggers ainda impressiona por sua linguagem visual e design de produção, proporcionando ao público uma experiência estética deslumbrante e um passeio macabro e profano pelo mundo do gótico

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Sobre DarkSide

Avatar photoEles bem que tentaram nos vender um mundo perfeito. Não é nossa culpa se enxergamos as marcas de sangue embaixo do tapete. Na verdade, essa é a nossa maldição. Somos íntimos das sombras. Sentimos o frio que habita os corações humanos. Conhecemos o medo de perto, por vezes, até rimos dele. Dentro de nós, é sempre meia-noite. É inútil resistir. Faça um pacto com quem reconhece a beleza d’ O terror. O terror. Você é um dos nossos.

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1 Comentário

  • Aline Terssetti

    8 de janeiro de 2025 às 11:36

    Concordo em partes sobre a oportunidade perdida de Eggers ao poder explorar outras fontes de narrativas. Porém, o Eggers tem uma característica “importante” nesse fato: ele quis fazer, praticamente, uma homenagem ao filme de 1922. Completamente respeitoso.
    Até mesmo em questões de figurino, ele é muito “exigente” para ser o mais compatível possível com a época. Por exemplo, Eggers pediu para a figurinista um sapato do Orlok – que aparece em segundos na tela – e ela teve que refaze-lo 20 vezes! E também a característica física do Orlok, diferente do de 1922, é uma mistura de Vlad com os Cossacos, homens do Leste Europeu que viviem a época que se narra a história.
    Então, é por conta de tudo isso que o Eggers não foi além de sua narrativa.
    Ademais, o filme é maravilhosamente bizarro e lindo!

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