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Caveira Viu: Tinnitus

Um mergulho no encontro do horror corporal com o psicológico

22/06/2023

Misturando drama com horror, Tinnitus é o mais novo filme de Gregorio Graziosi, diretor de Obra (2013). Após estrear mundialmente no 56º Festival Internacional de Cinema Karlovy Vary, o longa nacional finalmente chega nas salas de cinema brasileiras nesta semana. Então prepare a pipoca porque a Caveira já teve a oportunidade de conferir o filme a convite da Imovision e veio te contar o que achou. 

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Inspirado pelo quadro A Bigger Splash do artista britânico David Hockney, Graziosi conta a história de Marina, interpretada por Joana De Verona, uma talentosa atleta de saltos ornamentais que após uma súbita crise de tinnitus — um constante e forte zumbido no ouvido — acaba sofrendo um grave acidente que a afasta do esporte. Anos mais tarde, ela permanece em tratamento médico, trabalhando como sereia em um aquário local. No entanto, tudo muda quando volta às plataformas e ao mundo da competição atraída por Teresa (Alli Willow), a jovem atleta que a substituiu. 

a bigger splash
(c) David Hockney / Photo (c) Tate

Com uma excelente edição e mixagem de som, que nos fazem — com perdão do trocadilho — mergulhar na trama, Tinnitus é uma grande experiência sensorial guiada pelos constantes zumbidos que atormentam nossa protagonista. São desses zumbidos que emerge grande parte do horror do filme, que se apoia imensamente no subgênero do horror corporal para criar aflição em seus espectadores. Diferentemente das produções de mestres do gênero, como David Cronenberg e Julia Ducournau, Tinnitus não parte do corpo grotesco ou chocante, mas sim de um horror interno, invisível e sutil. Um zumbido. Algo que os outros não escutam. Algo que vem de dentro de você.  

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Isso faz com que o corpo de Marina seja seu grande inimigo. Afinal, são os zumbidos que acarretam sua aposentadoria prematura, assim como seu gradual descolamento da realidade que a cerca. Nisso, o filme procura inspirações nítidas no cinema de David Lynch para criar não apenas um ambiente surrealista que questiona o tempo todo o que é real e o que não é, como também belíssimas imagens subaquáticas. 

Uma das principais inspirações lynchiana do longa está na personagem de Teresa, que é introduzida na trama quase como um duplo de Marina. A personagem de Alli Willow se posiciona metaforicamente como uma fragmentação da protagonista: ocupa seu lugar no esporte, veste suas roupas e deseja sua vida. Além dos filmes de Lynch, é possível enxergar inspirações em Um Corpo que Cai (1958) do diretor Alfred Hitchcock, Cisne Negro (2010) de Darren Aronofsky e A Malvada (1950), clássico protagonizado por Bette Davis.

tinnitus
Divulgação

No entanto, é justamente nisso que o filme escorrega. Teresa, uma personagem extremamente interessante que é inserida como duplo de Marina, não chega a lugar algum. O mesmo acontece com outros personagens, como Inácio, brilhantemente interpretado por Antônio Pitanga, um homem que passou a sofrer de tinnitus após o falecimento da esposa. O filme é recheado de personagens assim, complexos e repletos de possibilidades narrativas, mas que ao final não recebem a devida atenção, parecendo meros instrumentos para o drama de Marina.

Aqui encontramos algumas frustrações com Tinnitus: o desperdício e a superficialidade. Desperdício porque o filme traz diversos temas para lá de interessantes que acabam não ganhando a devida ênfase: trauma, perda, competitividade, corporeidade, sexualidade, relações de gênero e descontrole. Superficialidade porque apresenta todos eles, mas de forma tão breve que parecem meras pinceladas de algo que poderia ser muito maior. Um bom exemplo está nos conturbados relacionamentos de Marina com o controlador e abusivo Santos (André Guerreiro), seu companheiro e médico, e com Luisa (Indira Nascimento), sua ex-parceira de competição. O filme almeja apresentar essas complexas relações humanas, mas acaba falhando ao não aprofundar e não criar nenhuma conexão com o público. É justamente nessa vontade de abraçar tantos temas que Tinnitus perde sua direção e consequentemente seu impacto no espectador.

Divulgação

Quando o filme resolve mostrar ao que veio, finalmente jogando Marina em uma espiral de ansiedade e insanidade causadas pelo tinnitus, é tarde demais. Nisso — é é impossível não lembrar da bailarina Nina, interpretada por Natalie Portman em Cisne Negro —, tanto Marina quanto Nina passam a ser dominadas pelo perfeccionismo e pela competitividade, dando literalmente tudo pela arte — seja o balé ou o salto ornamental. 

Contudo, mesmo que Marina recorra aos extremos para enfrentar os obstáculos que aparecem perante seu retorno ao esporte que tanto ama, Tinnitus parece não ter a mesma determinação e acaba sofrendo de falta de ritmo e emoção. Embora seja muito bem filmado e editado, entregando cenas bonitas e bem enquadradas, o resultado final é um pouco frio e asséptico. Principalmente quando pensamos em todas as possibilidades apresentadas a partir do flerte com o horror corporal e o horror psicológico

Com uma trama instigante e personagens densos e amargurados, Tinnitus mescla bem horror, suspense e drama, mas o resultado é um tanto disperso e sem emoção. Com um elenco de peso e estética bem trabalhada, o filme parece ter medo de abraçar tudo que poderia potencializar seus mistérios, temas e imagens. 

No entanto, mesmo não tendo criado uma grande conexão com Marina, não podemos deixar de questionar o que faríamos em seu lugar nem deixar de ficarmos impactados com a resolução de sua jornada, com certeza um dos pontos altos do filme. 

Afinal de contas, fica o questionamento deixado por Tinnitus: o que fazer quando nosso corpo e mente se tornam nossos principais inimigos?

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Sobre DarkSide

Avatar photoEles bem que tentaram nos vender um mundo perfeito. Não é nossa culpa se enxergamos as marcas de sangue embaixo do tapete. Na verdade, essa é a nossa maldição. Somos íntimos das sombras. Sentimos o frio que habita os corações humanos. Conhecemos o medo de perto, por vezes, até rimos dele. Dentro de nós, é sempre meia-noite. É inútil resistir. Faça um pacto com quem reconhece a beleza d’ O terror. O terror. Você é um dos nossos.

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