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Sopranos 25 anos depois: um legado que perdura

O início da era dos anti-heróis da TV

16/09/2024

Permitam-me começar este texto usando do chavão de quem acabou de ser cancelado nas redes sociais: quem me conhece sabe… mas, calma, eu não fiz nada digno de um cancelamento (até agora, pelo menos). A introdução é mais para dizer que quem me conhece sabe que eu sou obcecada por Sopranos – ou por Família Soprano, na tradução original da HBO, canal que, há 25 anos, colocou a série de David Chase no ar. Para quem não me conhece, prazer, meu nome é Liv Brandão e eu sou obcecada por Sopranos.

LEIA TAMBÉM: Lançamento: Família Soprano: Menu de Episódios, por Matt Zoller Seitz e Alan Sepinwall

Sou jornalista, e desde 2008 cubro o mundo das séries de TV. Primeiro para o extinto Séries ETC, da Globo.com, depois para o jornal O Globo e para o UOL. Hoje, comento séries e filmes no podcast Cinemático, do B9, e vira e mexe escrevo sobre o assunto aqui para o DarkBlog. Nos primeiros anos da minha vida profissional, o cinema ainda era visto como a grande arte audiovisual e as séries de TV norte-americanas que aqui chegavam ainda eram pejorativamente chamadas de “enlatados” — como se fossem feitas numa fábrica de salsichas, sabe? E por muito tempo foi assim mesmo. Até que Sopranos veio e mudou tudo.

Saída da cabeça de um ambicioso, mas não tão bem sucedido roteirista de Hollywood — o tal David Chase — a série trazia um plot incomum, que facilmente poderia descambar para o pastelão caso tivesse sido “enlatada”: um chefe da máfia de Nova Jersey com mommy issues que procura uma psiquiatra/psicanalista para tratar de suas crises de pânico. Mas, se hoje vemos séries com anti-heróis e anti-heroínas como Breaking Bad, Fleabag e Succession, foi porque lá atrás David Chase deu ao seu Tony Soprano camadas e mais camadas. 

tony soprano

Sim, e o mérito disto não é apenas de Chase. Ao escalar James Gandolfini (1961-2013) para o papel, eles, juntos, criariam um personagem do quilate de um Michael Corleone, de um Tony Montana. A ambiguidade de um protagonista carismático, mas ao mesmo tempo violento e mau caráter, capaz de proteger a sua família a qualquer custo, enquanto era obrigado a assassinar os próprios amigos que o denunciaram para o FBI não encontrava precedentes. Ao menos não na TV. Mas mesmo o cinema, mais dado a este tipo de conflito, não tinha tempo de tela hábil para esmiuçar as sutilezas da construção da trama e dos personagens de Sopranos.

Por seis temporadas, de 1999 a 2007, Sopranos se propôs a esgarçar os limites até então impostos na TV. Trouxe profundidade, lirismo, contradições que até então eram raríssimas. Se hoje fazemos binge watching em séries de um milhão de serviços de streaming, é porque, lá atrás, um canal ainda sem prestígio decidiu tornar-se um canal de prestígio e apostar na tal história do roteirista ambicioso, mas não tão bem sucedido. Foi porque Chase, este roteirista, e seu brilhante time — que incluía Matthew Weiner, criador de Mad Men, e Terrence Winter, que deu ao mundo a ótima Boardwalk Empire — não se contentaram em fazer o básico e trataram seus personagens com um respeito e dignidade como nunca antes vistos nas séries.

david chase

Em tempos de ofertas ilimitadas e saturação de conteúdo, Sopranos e seus 25 aninhos merecem todo o carinho que a HBO puder dar. Isso vale para obras originais como Todos os Santos de Newark, filme com o prólogo da história de Tony — brilhantemente estrelado por Michael Gandolfini, filho de James, que estava acompanhado do pai quando ele morreu precocemente de um ataque cardíaco fulminante em 2013. Antes mesmo da tragédia, David Chase me confessou que já estava em seus planos. Vale também para Um dos Nossos, documentário recém-lançado sobre a trajetória de Chase (e da série, já que as duas coisas são indissociáveis).

Em tempos de confusões mil com a Max e de uma desvalorização imensa das grandes obras da HBO, como seria impossível no pós imediato de Sopranos — e que aqui não vêm tanto ao caso — que o canal continue investindo em celebrar esta parte tão importante de sua história e para a história da TV e, sim, do cinema, como conhecemos. Depois de levar ao TikTok uma conta totalmente dedicada à série talhada para a linguagem daquela rede, tão associada aos jovens, que a HBO invista em restaurações em 4k, séries de extras e tudo o mais que Sopranos e o público merece.

Família Soprano é DarkSide®

Desde que comecei a cobrir séries, tenho um colega norte-americano como referência: Alan Sepinwall é um dos principais repórteres e críticos de TV e autor de The Revolution Was Televised, sobre a era de ouro da televisão (que, claro, conta com um capítulo sobre Sopranos) e também de Sopranos Sessions, cuja autoria é dividida com Matt Zoller Seitz

família soprano

Pois a DarkSide® e a Macabra acabam de anunciar o lançamento desde último aqui no Brasil, sob o título de Familia Soprano: Menu de Episódios. No livro, o leitor encontra análises detalhadas de cada um dos episódios e reflexões sobre o impacto da série. Há, ainda, uma entrevista inédita e reveladora com David Chase. O livro está em pré-venda e é perfeito para a degustação de todo aficionado da série, de Tony Soprano e de todos os seus comparsas.

LEIA TAMBÉM: Nicholas Pileggi: De repórter policial a roteirista de filmes de máfia

Sobre Liv Brandão

Avatar photoJornalista, criadora de conteúdo e roteirista. Passou por veículos como O Globo e UOL sempre falando de cultura e entretenimento. É especialista em séries de TV, mas também fala de filmes, música, literatura e o que mais vier.

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