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Tetsuo: Em breve seu cérebro também será de metal

Um marco do terror japonês para corações selvagens

24/05/2024

Hoje em dia não é segredo que o Japão é um grande celeiro para o horror, e que em momentos de desespero criativo, os mercados dominantes bebem da fonte e ainda roubam a água, mas nem sempre foi assim. Mesmo tendo produzidos clássicos absolutos como Onibaba (Kaneto Shindõ, 1964), Harakiri (Masaki Kobayashi, 1962) e Gojira (Ishirõ Honda, 1954), o mundo ocidental pouco fez para legitimar o talento e a criatividade dos criadores japoneses nos primeiros passos do que seria chamado de “horror moderno” (aliás, esse termo não faz o menor sentido, o horror é atemporal, mas esse é o termo simplório que alguns críticos despreparados usam por aí). Tudo mudou com a chegada do filme homenageado de hoje, um dos reis indestronáveis da Firestar (e de todo devoto verdadeiro do horror), Tetsuo: The Iron Man.

tetsuo

Tetsuo: The Iron Man, filme híbrido de horror e ficção científica, chegou ao mundo do terror para revolucioná-lo em 1989. Dirigido, escrito, produzido e editado por Shinya Tsukamoto, por aqui o filme recebeu o nome traduzido ao pé da letra de Tetsuo: O Homem de Ferro.

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Já nos créditos de abertura percebemos que esse não será um filme qualquer, graças ao toque de tambores japoneses que imediatamente nos lançam em uma situação de tensão e conflito. É apenas música sim, não é longa, mas é tudo o que ela precisa ser para construir uma atmosfera de receio e expectativa. Desse ponto somos lançados em um ambiente industrial, mas ao mesmo tempo apocalíptico, periférico, devastado. Existe uma expressão de miséria proposital em cada tomada, que se mistura com a intenção fabril e tecnológica da paisagem. Cabos, metal, fios, tubulações e partes motoras, fotografias de atletas humanos. De repente o gore, com um rapaz anônimo abrindo a carne da coxa e enfiando uma haste de ferro dentro dos músculos.

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Em mais uma sequência avassaladora, notamos a consequência desse ato. Infecção, podridão, larvas. E o desespero do homem que tentou se fundir à máquina. Ele corre, em uma fuga desesperada, e encontra um atropelamento.

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Ignorando o que acontece ao seu redor, as máquinas seguem sua própria partitura, compondo, recompondo e reciclando o mundo dos humanos, tornando tudo prático, esmaecido e sem cor, um mundo achatado, rígido e funcional no qual não existe espaço para a individualidade ou o raciocínio. As máquinas estão infectando a humanidade, é o que o filme projeta em cenas carregadas de efeitos visuais e sonoridades vibrantes. Tetsuo não possui uma narrativa convencional, em vez disso, o filme como um todo é uma experiência sensorial, onde cada cena se converte em uma peça, um componente de uma estrutura maior e mais complexa. Tetsuo é como um motor, um relógio mecânico, uma linha de programação que não faz sentido quando separada das demais frases do código.

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Depois do atropelamento, conhecemos um outro personagem (é sugestivo que ele seja o motorista do acidente), ele está em frente a um espelho, removendo o que parece uma lanceta, um espinho metálico que brotou em seu rosto, de dentro para fora, como barba. O homem tenta remover a espícula e se fere, mas segue com sua vida, pegando o metrô. Ele treme, transpira, parece vítima de uma infecção. Ao que parece, ele não é um único, uma mulher no mesmo trem também está sendo invadida por algum tipo de vida biomecânica. Ela o persegue, e nessa interação entre personagens, o body horror extremo e a combinação de cenas chocantes com uma trilha sonora histérica eleva a potência do filme do incômodo ao perturbador.

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Na cena seguinte nosso amigo está ainda mais contaminado pela mecanização, pelo aço, e ele não é o único. Sua namorada também está carregada de novos “equipamentos”, e com um deles — uma longa mangueira corrugada com cabeça oblonga —, ela o sodomiza em um frenesi sexual. O homem acorda em pânico, tocando o próprio corpo, esperançoso que tudo não tenha passado de um pesadelo. Infelizmente foi um pesadelo sim, mas ele foi real, e toma proporções avassaladoras nas sequências seguintes. O homem está condenado, tomado por forças, seres e impulsos que ele é incapaz de dominar ou mesmo compreender. Nessas cenas, Tetsuo definiu, e por muitas décadas, o que poderia ser considerado extremo. Depois de Tetsuo, o cinema de horror tinha uma nova régua, uma que dificilmente seria alcançada. 

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O rapaz atropelado também vive, corrompido e incrementado por máquinas, fios, circuitos e tubulações. Um ser feito de memórias, aço e carvão, uma profanação do que um dia foi humano e agora precisa ser redefinido. O outro homem, o motorista, está mais transformado ainda, ele agora é praticamente um motor que caminha, fala e pratica sexo de uma forma depravada e assassina. Só nesse momento percebemos que ele é de fato o motorista, e sugere-se a causa do acidente, suas consequências, e motivos de toda loucura e selvageria que se estabelecem.

Como muitos já disseram, Tetsuo não é somente um filme de horror, ou uma obra de experimentalismo audiovisual, mas sim um dos poucos filmes revolucionários que consegue ser atemporal, como uma obra de arte de grandeza maior, de intenções perigosas (e de certa forma premonitórias) e valor incalculável. Os momentos finais do filme são pura loucura, horror corporal e corrupção da carne, mas também são justiça, perturbação, angústia e novas direções ao gênero horror. Seja você um fã do horror, um estudioso acadêmico ou um criador artístico de qualquer modalidade, esse filme precisa obrigatoriamente estar na sua estante, seja para apreciação, estudo ou simples pavor. 

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Sendo assim, o que mais eu preciso fazer para você apertar esse play?

O trailer você confere aqui! 

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Sobre Cesar Bravo

amplificador cesar bravoCesar Bravo é escritor, criador de conteúdo e editor. Pela DarkSide® Books, publicou Ultra Carnem, VHS: Verdadeiras Histórias de Sangue, DVD: Devoção Verdadeira a D., 1618 e Amplificador.

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