Há algum tempo, tempo esse que não preciso especificar aqui, mas que posso dizer que foi um tempo considerável, eu recebi um convite maravilhoso do meu mentor, mestre e amigo Cesar Bravo. Ele estava organizando, em segredo, uma antologia para a DarkSide® Books, cuja ideia era homenagear Stephen King com contos que fossem inspirados em suas obras. Na hora, é claro, eu fiquei atônito, o sangue sumiu das pernas e eu queria gritar de alegria. Estar na DarkSide® era parte do sonho, era uma conquista sem tamanho para mim, então eu obviamente surtei. Mas o que ele disse em seguida foi ainda mais fatal: “Escolha uma obra, e escolha logo, antes que alguém a pegue, e ponha seu coração no conto.”
O que eu poderia escolher? Veja, para um leitor de King, as opções são diversas. Na hora, meio sem pensar, meio na maldade, eu dei a resposta que você leitor deve imaginar: “Eu quero A Torre Negra!”. “Tem certeza?”, disse Cesar Bravo, e se eu já tinha falado meio sem pensar, aquela era para terminar de travar meu cérebro. “É uma grande responsabilidade.” Eu disse: “Claro que tenho certeza!”. Eu não tinha. “Então a Torre é sua”, respondeu o homem, selando meu destino.
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Quem me acompanha sabe do amor que tenho pela saga A Torre Negra. Todos os sete livros originais da série foram meu primeiro contato com a obra do King. Eu sou apaixonado por tudo que se relacione a esse universo, que afinal é O Universo de Stephen King, a obra que une e dá sentido a todas as outras. Então, de certa forma, Bravo tinha muita razão. Era uma responsabilidade imensa, e sem pensar, eu tinha escolhido homenagear a obra mais importante do autor, missão que, de certa forma, exigiria uma puta duma coragem. Quem mais escolheria A Torre Negra? Mas se alguém poderia fazer essa homenagem, por que não eu?
Só havia um problema: Eu não fazia ideia sobre o que escrever.
Quem leu A Torre Negra sabe como aquilo é abrangente. O quanto de mitologia o King reuniu em todos os livros, nos livros que dão suporte à narrativa, nas pequenas referências à série, aos personagens e à própria Torre em outras obras… enfim, dupla responsabilidade. Dá tempo de trocar? Acho que não. Seria um pouco mais fácil escrever um conto onde Roland fosse o protagonista? Talvez, um pouco mais fácil… mas era justamente esse caminho que eu não podia seguir.
Levei alguns dias pensando, mas nada aparecia na minha cabeça. Nada que fizesse jus ao que significa A Torre Negra para mim, nada que traduzisse o sentimento que ela desperta, nada que reunisse o que ela representa como um todo na obra do King. “Cara… e agora?” Então lembrei que uma das coisas mais interessantes da Torre é como o King conecta diversos mundos e cria passagens entre eles; e que, quando li A Torre Negra: A Escolha dos Três, uma das imagens que ficou mais tempo na minha cabeça era as portas aparecendo para Roland na praia do Mar Ocidental… Portas… como elas pareciam brotar do nada, pareciam não estar presentes de fato ali, que bastava um passo para o lado e era como se elas não existissem mais… mas que, quando se envolvia a maçaneta com a mão, podia sentir que ela vibrava… que ela existia. E se abria para outros mundos. Outras realidades.
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Então, escrevi sobre uma porta. Uma pedra, uma rosa, uma porta não encontrada…
Escrevi de uma só vez, tentando trazer o horror que King esconde nos detalhes. Tentando imprimir a sensação fantasiosa e trivial de estar confuso com a própria realidade; de ser mais uma carta embaralhada no destino. De dar mais uma volta no ka. Escrevi, e até que gostei bastante do resultado.
Então, o tempo passou… o ka deu suas voltas. A ansiedade foi grande, e guardar o segredo, a pior parte. Tudo o que eu mais queria era que o livro saísse naquele fim de semana, naquele dia, naquela hora, porque esconder da galera era muito, muito chato. Você deve entender que, por motivos de mercado literário, anunciar sem confirmação, sem ter certeza absoluta de que o livro vai sair, é meio arriscado. As coisas podem dar errado, e elas dão o tempo todo no meio, acredite. E você também deve entender que esconder uma vitória do tipo (poxa, para mim era uma vitória e tanto!) é difícil. À medida que o tempo foi passando, rolava o medo de que o projeto de repente fosse cancelado. Mercados em crise, Bolsoasno no poder, cultura sendo chutada… sabe como é. Nem sempre é simples acreditar que vai dar certo.
Mas, no dia 11 de março de 2020, chegando por último no rolê e recebendo a notícia no WhatsApp porque estava em aula e não vi na hora, abri isto no Instagram:
Finalmente, o sonho estava se realizando! A Antologia Dark sairia, e com essa capa maravilhosa! Meu nome estava lá, junto com outros escritores que tanto admiro, com outros fãs de Stephen King, me unindo nessa ideia de homenagear o autor que, com seu jeito único de assustar e de revelar a alma humana, tocou nossos corações para sempre.
Foi uma felicidade sem tamanho saber que, enfim, aquele trabalho seria lançado. Vocês não imaginam o quão difícil é guardar um segredo do tipo…
Mas obviamente as coisas não seriam tão simples…
Lembram que o post de divulgação do livro saiu em 11 de março? Pois bem… nos dias seguintes, o Brasil entraria em sua malfeita e malfadada quarentena devido ao novo coronavírus, e o livro atrasou mais uns meses para sair. E depois que foi lançado, como eu moro aqui onde o Judas perdeu a cueca, o livro demorou mais um pouco para chegar… mas, finalmente, FINALMENTE, eu estou com ele em mãos! E ficou lindo demais!
Faltam-me palavras para dizer o quão orgulhoso e feliz estou. Meu conto ali, junto de tantos outros, em uma edição incrível! É uma sensação difícil de descrever. Eu espero que “Porta Não Encontrada” seja uma boa leitura, e especialmente, espero que os fãs da Torre se sintam homenageados também. Foi uma tentativa de ao menos tocar na superfície do que esses livros representam para mim e para vocês. Assim como tudo o que a DarkSide® faz, esse conto também foi feito de fã para fã.
Eu agradeço demais à DarkSide® Books e ao mestre Cesar Bravo pelo convite e pela confiança no meu trabalho. Nessa vida cheia de altos e baixos, mais baixos do que altos, é muito bom quando você sente, sem que alguém precise te dizer, que você está no caminho certo.
Everaldo Rodrigues
Escritor nasceu em Diadema, São Paulo. Leitor desde criança, foi o mestre Stephen King quem o colocou na trilha do horror, de onde não saiu mais. É autor de quatro livros, dentre eles a novela O Capeta-Caolho contra a Besta-Festa, com a qual ganhou o Prêmio ABERST DE LITERATURA 2018 na categoria Melhor Conto de Horror. Atualmente, estuda literatura na UNICAMP. O texto acima foi publicado originalmente neste link.
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1 Comentário
Ana Lúcia
5 de agosto de 2020 às 16:21
Ana Lúcia
5 de agosto de 2020 às 16:21
Sou uma leitora iniciante no mundo kinguiano, mas o pouco que li, 8 ou 9 livros por enquanto, me leva pra um universo totalmente louco, criativo e sensasional. Não há como não se apaixonar perdidamente.