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Mefisto e mais 6 livros que abordam o nazismo e a Segunda Guerra

Quando a literatura nos depara com traumas coletivos

19/09/2023

A literatura sempre foi um lugar privilegiado para lidarmos com nossos traumas, sejam eles individuais ou coletivos. O poder das palavras possibilita que abordemos assuntos difíceis e indigestos, mas ainda assim urgentes e necessários. A narrativa literária é uma forma de lidarmos com os fantasmas do passado e presente, como traumas coletivos que marcaram para sempre a história da humanidade. 

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A Alemanha nazista e a Segunda Guerra Mundial são, sem dúvida alguma, um trauma extensamente abordado pela literatura, assim como pelo cinema e diversos outros produtos midiáticos. Livros como O Diário de Anne Frank, É Isto um Homem?, Olga e A Lista de Schindler tratam das trágicas e devastadoras consequências do nazismo e autoritarismo a partir de personagens históricos reais, que viveram as mais diferentes trajetórias e vidas. Aqui, a literatura vai muito além do seu papel de entretenimento, assumindo a importante forma de denúncia histórica

Mas engana-se quem acha que apenas livros de não-ficção cumprem esse papel. Seja de forma metafórica ou mais direta, a ficção está repleta de obras que assumem esse caráter de denúncia e abordam o nazismo, o autoritarismo e seus resultados cruéis. Um bom exemplo disso está nas histórias em quadrinhos. São inúmeros os super-heróis que já enfrentaram o nazismo e abordaram o contexto da Alemanha nazista, como a Mulher-Maravilha, o Capitão América e o Super-Homem. No caso dos X-Men, por exemplo, há toda uma relação metafórica com o antissemitismo e a perseguição aos judeus. A própria história de origem de Magneto, um dos maiores vilões da Marvel, está diretamente relacionada ao nazismo, já que o personagem é sobrevivente do Holocausto e perdeu sua família em um campo de concentração. 

Outro bom exemplo de como a ficção é um campo privilegiado para esse tipo de narrativa é Mefisto, publicado em 1936 pelo alemão Klaus Mann, publicado pela DarkSide® Books. Utilizando como ponto de partida a clássica premissa do pacto fáustico, Mann conta a história de Hendrik Höfgen, um ambicioso ator que renuncia seus ideais revolucionários em troca da ascensão meteórica de sua carreira artística. Tudo isso em plena Alemanha nazista. 

Mefisto

Embora tenha sido publicado na década de 1930, durante a ascensão do Terceiro Reich e um pouco antes da Segunda Guerra Mundial, Mefisto está diretamente ligado a Fausto, clássica peça de Goethe, que utiliza como base a lendária história do personagem que, em troca de conhecimento, negocia a própria alma com Mefistófeles. As duas obras se aproximam não apenas pela temática do pacto e da ganância humana sem limites, mas também porque em Mefisto Höfgen está encenando uma produção de Fausto, interpretando Mefistófeles. Enquanto na peça o ator é o demônio, na vida real ele encarna Fausto, aproximando-se e compactuando com o Partido Nazista, um demônio de carne e osso, em prol de seus próprios interesses e ganhos pessoais. 

Para escrever Mefisto, Klaus Mann (que na época encontrava-se exilado na Holanda) se inspirou em pessoas reais e conhecidas, principalmente em seu cunhado, o ator Gustaf Gründgens, o que levou a obra a ser censurada na Alemanha. A censura foi derrubada em 1971 e uma década depois, em 1981, o livro foi adaptado ao cinema sob direção do húngaro István Szabó e protagonizada por Klaus Maria Brandauer. 

Mefisto é uma obra que nos faz refletir sobre temas importantes, como a ganância humana, o autoritarismo político, o perigo de propostas tentadoras e é claro, todas as feridas deixadas pelo nazismo. Considerando a urgência desse tema, a Caveira separou alguns livros que também abordam, explícita ou implicitamente, essas questões. 

1. Maus

Lançada de forma serializada entre 1980 e 1991, Maus é uma graphic novel do cartunista norte-americano Art Spiegelman, que mostra o artista entrevistando seu pai, Vladek, um judeu polonês sobrevivente do Holocausto. A graphic novel alterna entre o tempo presente da entrevista e o passado contado por Vladek, passando dos anos que antecederam a Segunda Guerra Mundial até sua libertação do campo de concentração. 

maus

Misturando os gêneros literários de biografia, memória, história e ficção, Maus foi a primeira graphic novel a ganhar o famoso prêmio Pulitzer. Para além da história impactante, a obra chama atenção por sua estrutura narrativa e também seu estilo de desenho, com os judeus sendo representados como ratos, os alemães como gatos e os poloneses como porcos

2. O Homem do Castelo Alto

Escrito em 1962 pelo norte-americano Phillip K. Dick, O Homem do Castelo Alto é uma distopia que parte da chamada História Alternativa, um subgênero da ficção especulativa que questiona o que teria acontecido se eventos históricos tivessem tomado outro rumo a partir de pontos de divergência. Utilizando elementos da ficção científica, Dick ambienta sua história no anos 1960 em um mundo em que os países do Eixo derrotaram os Aliados e venceram a Segunda Guerra Mundial, encerrada em 1947. Nesse futuro alternativo, os Estados Unidos passam a ser controlados pela Alemanha Nazista e pelo Império do Japão.

o homem do castelo alto

Considerado um clássico do tema, O Homem do Castelo Alto é uma das primeiras obras a abordar esse tipo de questionamento, sendo seguida por inúmeras outras, como Pátria Amada do britânico Robert Harris, que indagam o que teria acontecido se a Alemanha tivesse vencido o confronto armado. Dick levou o Prêmio Hugo em 1963 e o livro foi adaptado para a televisão em 2015.

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3. Matadouro-Cinco

Misturando narrativa autobiográfica com ficção científica, Matadouro-Cinco foi lançado em 1969 por Kurt Vonnegut. O livro segue de forma não linear a vida, as memórias e experiências de Billy Pilgrim, passando por seu tempo no Exército Americano durante a Segunda Guerra Mundial, sua captura pelo Exército Alemão, a construção de uma carreira bem-sucedida como optometrista e a abdução alienígena a qual foi submetido.

matadouro cinco

De forma original e única, Vonnegut parte de suas próprias memórias enquanto prisioneiro de guerra, escrevendo inclusive sobre o bombardeio da cidade alemã de Dresden em fevereiro de 1945, que resultou na morte de mais de 20 mil pessoas. Matadouro-Cinco mescla o tema antiguerra com o da viagem no tempo e espaço, entregando uma história psicodélica que aborda a maldade humana, a futilidade da guerra e o conformismo coletivo. Em 1972, o livro foi transformado em um filme homônimo dirigido por George Roy Hill e protagonizado por Michael Sacks.

4. A Menina que Roubava Livros

Narrado por ninguém mais, ninguém menos que a própria Morte, A Menina que Roubava Livros acompanha a trajetória da pequena Liesel Meminger, que tenta sobreviver durante a Alemanha Nazista. Ambientado entre 1939 e 1943, o livro segue os encontros que a Morte tem com a garotinha que rouba livros e é confrontada com os horrores da guerra.

a menina que roubava livros

Embora seja um trabalho de ficção do escritor australiano Markus Zusak, A Menina que Roubava Livros mostra pela perspectiva de Liesel o ambiente do Terceiro Reich, da Juventude Hitlerista e da perseguição aos judeus, abordando a crueldade humana, a violência do autoritarismo e o fim da infância.

5. Farenheit 451

Publicado em 1953, logo após o fim da Segunda Guerra, pelo autor norte-americano Ray Bradbury, Fahrenheit 451 retrata um futuro distópico em que a leitura é uma atividade banida da sociedade. O personagem principal da história, Guy Montag, é justamente um bombeiro cuja profissão não é apagar o fogo, mas sim ateá-lo em livros, objetos proibidos e criminalizados. 

farenheit 451

Embora Fahrenheit 451 aborde uma ampla gama de temas, como a censura, a alienação, a perseguição ao pensamento crítico e a importância da leitura, é impossível não pensar nas grandes queimas de livros promovidas pelo Partido Nazista na década de 1930, que levou à perseguição de intelectuais e escritores considerados “inimigos” do regime. Inclusive, um deles foi o pai de Klaus Mann, autor de Mefisto, o célebre escritor, Thomas Mann.   

6. 1984

Assim como Fahrenheit 451, 1984 é um livro que reúne diversos temas importantes. Lançado em 1949 pelo escritor britânico George Orwell, a distopia retrata um superestado totalitário chamado Oceânia, onde vigora a vigilância onipresente e rígidas regras de comportamento. Aqui acompanhamos a rotina de Winston Smith, um funcionário no chamado Ministério da Verdade. 

1984

Tematicamente, 1984 centra-se nas perigosas consequências do totalitarismo, da repressão da sociedade, da obediência cega, das propagandas de ódio e da vigilância em massa. Um dos modelos de Orwell, que enfrentou os fascistas na Guerra Civil Espanhola e presenciou bombardeios nazistas na Segunda Guerra, para o estado autoritário centralizado em um líder absoluto foi justamente a Alemanha Nazista. 

Mefisto e os demônios nazistas

Os horrores do nazismo e totalitarismo, assim como suas consequências e traumas, podem ser abordados de diferentes formas na literatura, passando por narrativas biográficas e ficções científicas distópicas. 

Outro bom exemplo é O Leitor, publicado pelo alemão Bernhard Schlink, livro que aborda as dificuldades enfrentadas por gerações pós-guerra na Alemanha em compreender o Holocausto. Já Ele Está de Volta, do alemão Timur Vermes, utiliza da sátira para trazer Adolf Hitler de volta à vida em 2011 com a desconcertante revelação de que ainda existem pessoas dispostas a ouvi-lo

Como todas as obras citadas, Mefisto de Klaus Mann também se insere junto a essas histórias urgentes, assustadoras e que infelizmente possuem semelhanças aterrorizantes com os nossos tempos. Obras como a de Mann urgem a discussão acerca da opressão, do preconceito e totalitarismo, nos lembrando que sim, os demônios estão sempre à espreita com ofertas tentadoras, mas catastróficas. 

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Sobre DarkSide

Avatar photoEles bem que tentaram nos vender um mundo perfeito. Não é nossa culpa se enxergamos as marcas de sangue embaixo do tapete. Na verdade, essa é a nossa maldição. Somos íntimos das sombras. Sentimos o frio que habita os corações humanos. Conhecemos o medo de perto, por vezes, até rimos dele. Dentro de nós, é sempre meia-noite. É inútil resistir. Faça um pacto com quem reconhece a beleza d’ O terror. O terror. Você é um dos nossos.

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