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C.H.U.D.: Um clássico subestimado

O que é pior que criaturas mutantes emergindo do subsolo?

15/12/2023

Depois de anos convivendo com o garimpo em technicolor da Firestar Videolocadora, é um pouco incomum esbarrarmos em um filme de horror que ainda não tenhamos visto, ou que não tenhamos o elencado com o devido reconhecimento. Esse é o caso de hoje para nossa coluna.

Dirigido por Douglas Cheek, C.H.U.D. recebeu por aqui o título razoável de C.H.U.D. – A Cidade das Sombras, e acabou se tornando um clássico não tão celebrado ao longo dos anos, sendo sobrepujado por outras criaturas mutantes do mundo subterrâneo como grandes aligátores, homens rato e tartarugas mutantes ninjas.

Mas vamos direto ao ponto e sem enrolação já que o filme começa dessa mesma forma. O ambiente noir da primeira cena, no qual uma mulher passeia com sua cadelinha segundos antes de ser atacada, chama a atenção logo de cara. Noir nessa descrição significa uma rua com aparência de beco, ambiente chuvoso, o calçamento reflete sujeira e desgaste, abandono. Nessa rua, a Lafayete, em Manhattan, como em muitos locais periféricos americanos, os bueiros secretam a fumaça do dejeto orgânico que circula nas galerias do esgoto. Mas desse bueiro em particular, além da fumaça emerge um braço deformado que ataca nossa jovem senhora (e seu doguinho), os arrastando para baixo.

No dia seguinte, o ambiente decadente se torna ainda mais pronunciado, enquanto acompanhamos o despertar da cidade, ao lado do fotógrafo George Cooper e de sua namorada, a modelo Lauren. O filme segue deixando claro que a presença subterrânea não é das mais amigáveis. Pessoas estão desaparecendo, e para completar a crise os oficiais de polícia estão de mãos atadas pelos políticos locais (que não precisam de uma mancha de desaparecidos em sua reputação, além de outros detalhes que o filme só traz mais tarde). O capitão de polícia Bosch decide ir em frente e investigar, e descobre que muitos moradores de rua estão sendo sugados por essas outras “coisas” que moram no subterrâneo da cidade; nas galerias de esgoto e túneis de metrô. Bosch não parecia tão interessado em pegar esse caso e ajudar os moradores de rua em um primeiro momento, mas a coisa muda de figura quando sua esposa também desaparece.

O conceito de uma cidade embaixo da cidade, ou de uma cidade oculta pela cidade foi explorado algumas vezes no cinema de horror, mas C.H.U.D. faz isso com bastante propriedade. Essa cidade oculta, no entanto, está com índices perigosos de radiação, agentes de inspeção trabalham incansavelmente retirando as pessoas que conseguem, às vezes usando força bruta, em sigilo. De posse dessa informação, o capitão Bosch decide agir com mais energia, e acaba descobrindo, em uma reunião com autoridades da cidade, que os esgotos estão servindo de depósito para resíduos radioativos — e para criaturas humanoides subterrâneas canibais que se originaram a partir dele. Sim, e é aí que a história fica mais interessante.

A principal estratégia de Bosch contra o bloqueio das investigações e as cortinas de fumaça dos políticos é a ameaça de entregar tudo aos jornais com o apoio de seus aliados. Entre eles, está o mantenedor de uma ONG que ajuda pessoas em situação de vulnerabilidade social, o Reverendo, interpretado por Daniel Stern — que o mundo conheceria bem mais em Esqueceram de Mim.

Paralelamente, o fotógrafo Cooper, aquele do começo do filme, descobre que sua namorada está grávida, mas ele continua descendo até os subterrâneos algumas vezes, o que pode ser um risco, principalmente depois que as autoridades decidem bombear gás letal lá embaixo.

Agora, finalmente, estamos com todas as peças na mesa, então espero ter convencido vocês a se arriscarem nesse filme. Ainda teremos algumas surpresas até o final, e um gore bem satisfatório em algumas cenas. Em uma época em que o mundo tremia sob o a possibilidade de um acidente radioativo e o cinema era livre para arriscar alguns milhares de dólares, C.H.U.D. ocupa lugar de destaque entre um sem número de produções que abordaram esse mesmo tema. C.H.U.D. é mais um filme B que se leva muito a sério, e esse possivelmente é seu ingrediente mais especial (embora também seja fundamental no filme a batalha entre os poderes sociais que nunca visam o bem comum até perderem alguém de seu círculo íntimo).

Outro detalhe que também soou bastante positivo foram as tomadas visuais da cidade, o ambiente cinzento das ruas, o fiel retrato da periferia das grandes cidades americanas da época. Existe um tom de desmazelo real nessas cenas que, hoje em dia, chega nos enfeitiçar, a ponto de queremos trazê-lo de volta, mesmo que seja por alguns minutos de apreciação. Quem também faz uma aparição surpresa saudosa é John Goodman, que encarna (em um de seus primeiros papéis) um policial fazendo piadas de duplo sentido em uma lanchonete, um pouco antes de…

O que pode ser pior que criaturas canibais mutantes sequestrando “jantares” e morando no subsolo de sua cidade? Se quer descobrir essa resposta e ainda curtir um bom filme, aperte logo esse play.