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Conheça a relação de Machado de Assis com os pecados do Rio de Janeiro

Obras do autor retratam uma cidade fervilhando em mudanças

07/09/2022

Fascinante, vibrante e repleta de pecados. Machado de Assis é um autor que alimentou uma relação nem sempre estável, mas absolutamente íntima com a cidade do Rio de Janeiro. A ampla maioria de suas histórias é ambientada na capital carioca, que também pode ser considerada um personagem do autor.

LEIA TAMBÉM: LANÇAMENTO: MACHADO, A CIDADE E SEUS PECADOS, DE MACHADO DE ASSIS

Em Machado, a Cidade e seus Pecados, uma coleção de contos, novelas e fragmentos de romances do autor, ele estabelece um diálogo natural entre pecados e pecadores, tudo isso observado e acolhido por uma cidade igualmente errante. De certa forma, o Rio de Janeiro é como as pessoas que ali vivem: belo e hostil, humano e animalesco e, por vezes, vibrante e ao mesmo tempo decadente. Uma cidade de dualidades que há séculos alimenta sentimentos de amor e ódio concomitantes.

Machado se manteve um fiel observador de cada detalhe do Rio de Janeiro ao longo da vida, ainda mais durante um período particularmente interessante para a história da cidade e do país. O Rio passou de capital do Império a capital da República, e foi palco de grandes transformações sociais no final do século XIX.

Machado de Assis
Machado de Assis / Imagem de domínio público

Com a abolição da escravatura em 1888 e a Proclamação da República no ano seguinte, a cidade passou a enfrentar problemas sociais em consequência do crescimento rápido e desordenado da população. Ex-escravizados e imigrantes europeus foram para lá em busca de oportunidades com o trabalho assalariado, o que praticamente dobrou a população da capital em um período de apenas dezoito anos, entre 1872 e 1890.

O Rio de Janeiro tem influência direta na vida de Machado. Foi lá onde ele nasceu, se criou e buscou inspiração para obras aclamadas no mundo inteiro. Conheça um pouco melhor essa jornada.

Morro do Livramento e São Cristóvão

Machado nasceu em 21 de junho de 1839 no Morro do Livramento. As terras do local eram ocupadas pela chácara da família de Maria José e começaram a ser loteadas em 1818, de tão grande que era o terreno. A região tinha forte influência católica, com missas realizadas frequentemente.

A região foi descrita pelo escritor no folhetim Casa Velha, publicado entre os anos de 1885 e 1886 na revista carioca A Estação, e em formato de livro somente em 1943. No romance, Machado de Assis descreve a casa que conheceu durante a infância, dando alguns detalhes da rotina de visitas, serviços, do gado e até mesmo das missas da região.

Morro do Livramento
Morro do Livramento / Imagem de domínio público

Aos 10 anos de idade, Machado perdeu a mãe e se mudou com o pai para a rua São Luís de Gonzaga, em São Cristóvão. Logo, o pai se casou novamente com a madrasta do escritor, que acabaria assumindo sua criação em alguns anos com a morte do pai dele. Alguns biógrafos relatam que ela confeccionava doces numa escola para meninas, e Machado teve aulas no mesmo prédio, além de aprender francês com um padeiro imigrante.

Seu primeiro livro de contos, intitulado Contos Fluminenses, é ambientado no Rio de Janeiro do período imperial. Nesta época, a cidade servia mais como um pano de fundo, ainda que repleta de vida, sem receber menções mais incisivas como viria a ocorrer nas crônicas de A Semana.

O Centro fervilhante

Dizem que Machado de Assis evitou os subúrbios do Rio, buscando sempre morar na região central da cidade e na Zona Sul, que então se expandia. Um de seus endereços mais conhecidos é a rua do Cosme Velho, que compõe seu epíteto “Bruxo do Cosme Velho”. Lá ele morou com a esposa Carolina Augusta, e foi onde ambos permaneceram até o fim de suas respectivas vidas.

LEIA TAMBÉM: POR QUE MACHADO DE ASSIS ERA CHAMADO DE BRUXO DO COSME VELHO?

Para a obra machadiana a vivência no Centro da cidade trouxe grandes contribuições, já que o autor era um observador voraz de tudo o que acontecia. A rua do Ouvidor, por exemplo, aparece nas crônicas de A Semana, consideradas por críticos as suas melhores.

Os textos se referem ao local como o centro nervoso da cidade, o local onde as notícias e as novidades eram colhidas — fossem elas verdadeiras ou não. Era um lugar em que você podia chegar de manhã sem saber de nada, e sair ao meio-dia absolutamente bem ou mal-informado sobre tudo e todos.

A rua, conhecida por suas lojas de moda, joalherias, chapelarias, café e livrarias, não era muito extensa, mas Machado comentava a demora que se levava para percorrê-la: “Em três pernadas a andamos toda, e se não o fazemos em três minutos, é porque temos o passo vagaroso; mas em três horas vamos do Beco das Cancelas ao Largo de S. Francisco”.

A demora também se devia ao fato de que lá vagueavam os ociosos. Uma das características mais marcantes para o observador Machado era o fato de que ali era um local propício a boatos e burburinhos, que muitas vezes ganharam crônicas próprias. Também não era um local adequado a segredos, na visão do autor, que defendia que isso era um risco para governos, que deveriam se manter longe da rua do Ouvidor.

Casa de Machado de Assis
Casa de Machado na rua do Cosme Velho / Imagem de domínio público

Crescimento, modernização e criminalidade

Além de ser um observador da vida cotidiana e de captar aspectos mais abrangentes da cidade, Machado também comentou os desdobramentos do crescimento descomunal do Rio. Ele ironizou a expulsão dos ambulantes e as medidas do governo de intervenção urbana no Centro, expondo como o interesse privado muitas vezes se sobrepõe ao interesse público. 

A instalação de linhas de bonde em 1868 também recebeu a atenção do escritor, que classificou o meio de transporte, juntamente da Gazeta de Notícias, “os dois maiores acontecimentos dos últimos trinta anos nesta cidade”. Ele registrou não apenas a implantação, mas a evolução da tecnologia do bonde em diversas crônicas, jamais deixando de problematizar os eventuais acidentes e transtornos dos passageiros na época.

Com o crescimento desordenado da população do Rio, veio também o aumento da criminalidade, fato que não passou despercebido ao olhar apurado de Machado. Uma presença dominante em sua crônica é a do gatuno, não se limitando apenas aos fatos, mas inserindo essa figura no rol de problemas de sua época e dos intrínsecos pecados humanos.

É dessa maneira, íntima, apaixonada, por vezes decepcionada e com uma crítica repleta de conflitos internos, que Machado de Assis fez do Rio de Janeiro um de seus mais imponentes e recorrentes personagens. Ler suas histórias e crônicas é praticamente uma viagem a toda a efervescência de uma capital que passa por diversas e aceleradas transformações, repleta de vícios e virtudes, tal qual a natureza humana.

LEIA TAMBÉM: MACHADO, A CIDADE E SEUS PECADOS: CONHEÇA OS 7 PECADOS CAPITAIS

Sobre DarkSide

Avatar photoEles bem que tentaram nos vender um mundo perfeito. Não é nossa culpa se enxergamos as marcas de sangue embaixo do tapete. Na verdade, essa é a nossa maldição. Somos íntimos das sombras. Sentimos o frio que habita os corações humanos. Conhecemos o medo de perto, por vezes, até rimos dele. Dentro de nós, é sempre meia-noite. É inútil resistir. Faça um pacto com quem reconhece a beleza d’ O terror. O terror. Você é um dos nossos.

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