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Sheridan Le Fanu: Conheça a mente que criou Carmilla

Escritor irlandês abriu caminhos para o terror vitoriano

09/08/2022

Muitos anos antes de Drácula popularizar o mito do vampiro, Sheridan Le Fanu apresentou ao mundo Carmilla, uma das vampiras mais influentes da literatura. Embora a Irlanda seja um país fértil de famosos escritores como Bram Stoker, Oscar Wilde, James Joyce e Samuel Beckett, o nome de Le Fanu nem sempre é um dos mais lembrados, apesar de sua influência ser sentida até os dias de hoje.

O escritor precedeu os conterrâneos Stoker e Wilde, abrindo caminhos para a literatura de um terror que queima devagar, permeado pelo mistério e pelas sutilezas do que pelo choque dos sustos ou do gore. Conhecido como um prolífico contador de histórias de fantasma, Le Fanu parecia prever o tom macabro que tomaria conta da literatura vitoriana.

Infância e vida familiar

Joseph Thomas Sheridan Le Fanu nasceu em Dublin em 1814. Filho de um clérigo da Igreja da Irlanda (uma ramificação da doutrina anglicana) chamado Thomas, o jovem Sheridan contou com muitos exemplos literários de perto: sua avó e tio-avô eram roteiristas de teatro e sua mãe, Emma, também era escritora. Ele era tio da autora Rhoda Broughton, que está em Vitorianas Macabras.

Embora tivesse a instrução de um tutor, as aulas não lhe ensinaram muita coisa, e o professor foi demitido. Le Fanu acabou usando a biblioteca do pai e se educou de modo autodidata. Aos 15 anos começou a escrever poesia, algo que ele compartilhou apenas com a mãe e os irmãos, mas nunca com o pai religioso.

A família do escritor passava por dificuldades financeiras constantemente, o que levou Thomas a se mudar com a família para o sul da Irlanda. Porém, as revoltas sociais contra os dízimos cobrados pela Igreja prejudicaram consideravelmente a renda da família, que ainda contava com os baixos valores de alguns aluguéis de propriedades.

A carreira de escritor e a morte da esposa

Sheridan Le Fanu estudou no renomado Trinity College a distância, comparecendo somente para as provas, e se formou em Direito. Em 1839 chegou a ser chamado para advogar, mas nunca seguiu essa carreira, trocando-a pelo jornalismo.

Em 1838, Le Fanu começou a escrever contos curtos para a Dublin University Magazine, incluindo sua primeira história de fantasma, intitulada “The Ghost and the Bone-Setter” [O fantasma e o ortopedista]. Ele acabou se tornando proprietário de diversos jornais a partir de 1840, incluindo o Dublin Evening Mail e o Warder.

Em 1844 se casou com Susanna Bennet, filha de um influente magistrado irlandês e neta de um ministro da justiça. O casal teve quatro filhos: Eleanor, Emma, Thomas e George.

Na década de 1850 seu casamento e vida pessoal se tornaram mais difíceis. Susanna sofria de crescentes problemas neuróticos e ansiedade decorrente do falecimento de diversos parentes próximos, incluindo seu pai. Em 1850 ela sofreu um “ataque histérico” e faleceu no dia seguinte sob circunstâncias incertas.

A morte da esposa teve um grande impacto na vida do escritor, que até se retirou da vida pública e parou de escrever por alguns anos. Os diários de Le Fanu sugerem que ele sentia algum tipo de culpa pelo falecimento de Susanna. Sua prima Lady Gifford, com quem se correspondia, foi uma das principais incentivadoras para que ele voltasse a escrever.

O retorno à escrita e o legado de Sheridan Le Fanu

Em 1861 ele se tornou editor e proprietário da Dublin University Magazine e passou a adaptá-la para o mercado inglês. Foi nesse periódico que ele publicou suas obras The House by the Churchyard [A casa no cemitério] e Wylder’s Hand [A mão de Wylder]. Isso lhe proporcionou assinar um contrato com uma editora inglesa que publicaria seus trabalhos.

A única condição do editor era de que ele ambientasse suas histórias para uma realidade mais inglesa, o que ele conseguiu com sucesso em Uncle Silas [Tio Silas], que se passa no condado de Derby. Porém, nos seus últimos contos Le Fanu voltou ao folclore irlandês.

O autor se aventurou por diversos gêneros, mas ficou mais conhecido pela ficção de terror. Sua escrita era trabalhada com cuidado e frequentemente aprimorava ideias de histórias antigas criadas por ele. Seus romances, por exemplo, frequentemente expandiram contos que escreveu no começo da carreira.

Le Fanu se tornou um especialista em criar um clima misterioso mais sutil, em vez de recorrer ao terror mais chocante. Ele gostava de deixar pontas soltas e passagens inexplicadas para elevar o mistério das tramas. O escritor também evitava apelar demais ao sobrenatural, frequentemente implicando uma explicação lógica para tais fenômenos.

Os últimos trabalhos de Le Fanu se tornaram seu legado mais aclamado, incluindo a novela Carmilla. Sheridan Le Fanu tem uma indiscutível influência em um dos autores de histórias de fantasma mais influentes do século XX, M. R. James, e, é claro, em Drácula de Bram Stoker.

Até hoje a cidade de Dublin mantém homenagens ao escritor: o Le Fanu Park e a Le Fanu Road. Desde o início do último século, com as possibilidades da internet, cada vez mais leitores têm demonstrado interesse pelo trabalho do autor, fortalecendo seu legado macabro.