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Spetses: conheça a ilha grega que inspirou O Mago

Ilha dos aromas e pinheiros foi o paraíso particular de John Fowles

18/12/2024

Já dizia Anthony Bourdain que viajar deixa marcas na memória, na consciência, no coração e no corpo do viajante. “Você leva algo com você. E, com sorte, deixa algo de bom para trás”. Se pensarmos que ao descobrir, explorar e vivenciar a ilha grega Spetses, John Fowles deixou para o mundo uma de suas obras-primas literárias, O Mago, a máxima de Bourdain se confirma.

A ilha dos aromas e dos pinheiros está localizada a cerca de 90 quilômetros de Atenas, capital da Grécia, fazendo parte do grupo das Ilhas Sarônicas. O seu nome grego antigo era Pityoussa, descrevendo a natureza florestal do local, coberto e abundante em pinheiros. O nome atual, Spetses, deriva do italiano e veneziano spezie, que significa especiarias e ervas, demonstrando sua importância na rota comercial náutica, à época em que foi governada pelos venezianos.

Com 27,121 km², e pouco mais de 3.700 habitantes, Spetses é ligeiramente maior que o arquipélago de Fernando de Noronha, no Brasil. Um destino entre as ilhas gregas que se popularizou e segue encantando pela rica história e cultura, além do cenário pitoresco de águas cristalinas. O local é a prova de que muito além da mitologia grega, dos deuses, heróis, ninfas e monstros, a história da Grécia possui muitas questões culturais que moldaram o local e influenciaram no contexto mundial.

Ilha influenciou vida pessoal e profissional de John Fowles

A história da ilha na vida de John Fowles iniciou quando o escritor mudou-se para Spetses para ensinar inglês na Escola Anargyrios e Korgialenios, em 1951. Seu primeiro encantamento foi já na proa do barco em que chegava, pelo lado leste da ilha, onde avistou o que descreveu como algo “flutuando como uma majestosa baleia negra em um mar noturno ametista”. A ilha, espessa de pinheiros que a cobriam de ponta a ponta, parecia para Fowles uma onda gigantesca verde, avançando em direção a costa.

Foi em Spetses que o escritor inglês conheceu sua futura esposa, Elizabeth, e, inspirado por suas experiências e sentimentos, deu vida ao suspense psicológico O Mago, publicado originalmente em 1965. Embora tenha sido escrito antes mesmo do seu primeiro grande sucesso, O Colecionador, foi publicado muitos anos depois. O período na ilha grega foi curto e encerrou em 1953 quando ele e outros professores da escola foram demitidos por tentar instituir reformas, obrigando Fowles a retornar para a Inglaterra.

A ilha-cenário retratada em O Mago é fictícia e chamada por Fowles de Phraxos, local onde o protagonista e escritor inglês Nicholas Urfe aceita um cargo como professor de língua inglesa, durante uma crise existencial. Se a estratégia de Fowles para manter o anonimato de Spetses foi criar uma outra ilha, já sabemos que os detetives literários de plantão logo descobriram esse mistério pelos relatos apresentados na narrativa do autor.

Além disso, em 1968 o filme O Mago, dirigido por Guy Green, e com participação do autor da obra original no papel de capitão do barco, foi filmado exatamente em Spetses.

Além de O Mago, também tiveram o local paradisíaco como cenário as produções cinematográficas de A Ilha do Amor (1963) e A Ilha Perdida (2001).

Spetses: uma ilha de tradições e história

No início dos anos 1970, James Campbell, ao entrevistar John Fowles, descreveu o destino como um lugar único, com aroma de orégano, tomilho e outras especiarias que ainda não haviam sido descobertas em outras partes da Europa. Apesar das diversas mudanças ao longo dos anos, Spetses ainda preservou muito da sua arquitetura histórica e cultura única, mantendo inclusive as ruas de paralelepípedos.

Uma das características da ilha é a proibição de automóveis particulares dentro dos limites da cidade. Dessa forma, os meios de locomoção são caminhadas, bicicletas, ciclomotores, e até carruagens, remetendo aos tempos antigos. Na área central apenas táxis e veículos de entrega são permitidos e o acesso à ilha é feito pelo porto ateniense de Pireu.

É possível conhecer Spetses em menos de um dia, com trilhas circundando a ilha totalizando cerca de 25 a 30 km. A ilha que floresceu durante o início do século XVII, hoje é marcada por mansões centenárias construídas pela costa, resultado de uma época em que dominava as principais rotas de navegação do Mediterrâneo, testemunhando a vasta riqueza da época.

Ocupada desde a Era Mesolítica, por volta de 8000 a. C., passou por diversos momentos de ascensão e decadência, além de períodos em que ficou totalmente abandonada. Foi ocupada pelos venezianos e serviu de refúgio para os arvanitas, um grupo populacional de origem albanesa, que fugiam da perseguição otomana, e que possui uma comunidade habitando o local até os dias atuais.

Spetses desempenhou um importante papel na Guerra da Independência Grega, e se tornou lar da heroína de guerra Laskarina Bouboulina. Hoje uma estátua em sua homenagem pode ser encontrada no cais principal. Laskarina assumiu o comando da frota do marido quando ele morreu, tornando-se membro ativo da organização revolucionária secreta que organizou a revolta.

A mansão da heroína, que foi a única almirante mulher na história naval mundial, abriga atualmente o Museu de Bouboulina, palco do festival cultural que acontece anualmente. Spetses foi a primeira das ilhas gregas a hastear a bandeira da Revolução, em 3 de abril de 1821.

Bekiris Cave e festival de Armata

Além das diversas praias que deixam os visitantes encantados, possui também um ponto que representa perfeitamente a beleza natural e histórica da ilha, a Caverna Bekiris. Localizada na praia Agii Anargiri, ela só pode ser acessada através de uma trilha ou de barco. Uma lenda antiga conta que a caverna era utilizada como refúgio para as mulheres durante a ocupação Otomana da Grécia.

Outra experiência única que só pode ser vivenciada em Spetses é a celebração de Armata, fetival realizado a cada segunda semana de setembro. O evento marca as batalhas durante a Revolução Grega de 1821. A celebração inicia algumas semanas antes, com locais trabalhando na construção de um barco de madeira, no antigo porto.

O evento de destaque se dá pela representação de uma batalha naval, com a queima de fogos de artifício, além de uma programação extensa em celebração à data. Esta é uma das festividades mais famosas da ilha, com dezenas de milhares de visitantes assistindo à encenação.

O local que inspirou John Fowles em uma das suas obras mais estudadas é, sem dúvidas, um destino encantador, oferecendo diversas atrações culturais e históricas, além de praias paradisíacas. Atualmente a ilha deixou de ser um centro marítimo e se transformou em um popular resort de verão, visitado por gregos e turistas do mundo inteiro.